A ARTE DA FUGA – POR JOÃO PEREIRA COUTINHO

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Eu só respeitarei a “coragem” dos 55 artistas (que enviaram carta à Fundação Bienal de SP) no dia em que eles viajarem para Bagdá, Riad ou Gaza e escreverem uma carta contra os governos locais. Em defesa da liberdade e dos “direitos humanos”. Isso, claro, se ainda tiverem mãos para escrever.


Quem leva a sério a opinião política dos artistas? Eu não. Deixei de o fazer com a ruína dos regimes totalitários.

Nas pinturas de Isaak Brodsky (sobre Lênin); nos filmes de Leni Riefenstahl (sobre Hitler); e nas telas de Alessandro Bruschetti (sobre Mussolini), a “arte política” deixou um testamento vergonhoso, que passou pela legitimação –melhor: pela exaltação das virtudes de psicopatas.

Exceções, sempre houve. Mas o casamento entre arte e política normalmente deu maus resultados. A “arte pela arte” não é apenas um bordão do século 19. É um conselho prudente para quem tem pretensões de se dedicar a ela.

Por isso ri alto com a carta aberta que 55 artistas enviaram à Fundação Bienal de São Paulo.

Ponto prévio: nenhuma pessoa adulta escreve cartas abertas em manada; quando falamos de artistas, ou pretensos artistas, a coisa ainda soa pior. Ou a arte vive da autonomia individual, ou não vive. Só covardes assinam em manada.

Mas os 55 revoltaram-se com o apoio financeiro que Israel concedeu à Bienal. Não querem dinheiro judeu porque acreditam que esse dinheiro, depois da guerra em Gaza, conspurca as suas integridades estéticas.

Se o dinheiro fosse da Autoridade Palestina, ou até do Hamas, talvez a conversa fosse outra. Não é. É de Israel.

Não vou regressar ao conflito entre Israel e o Hamas, que vive agora a sua trégua clássica antes do próximo confronto. Enquanto o mundo não entender direito a natureza islamita e jihadista do Hamas, não vale a pena gastar latim com o assunto.

Mas talvez não seja inútil fazer uma pergunta meramente teórica: de que vive a arte, afinal?

Arrisco uma resposta: a arte vive da liberdade. Um clichê sem grande importância?

Errado. Parafraseando Saul Bellow, eu gostaria de conhecer o Balzac dos zulus. Não conheço. Se Nova York, Londres ou Berlim são centros de excelência estética, isso deve-se à estabilidade política e à riqueza material de tais cidades.

E mesmo que a arte seja “engajada”, o que já me parece uma corruptela da sua vocação, convém que o “engajamento” seja direcionado para os alvos certos.

Os 55 artistas da Bienal falham nos dois planos.

Começando pela liberdade, basta consultar os rankings da ONG Freedom House para 2014. Não vou cansar o leitor com números e mais números. Resumindo, digo apenas: Israel é o único país do Oriente Médio e do norte de África considerado “livre”. O resto oscila entre “parcialmente livres” (Tunísia, Líbia, Kuait) e “não livres” (Iraque, Irã, Arábia Saudita).

E, para ficarmos na vizinhança de Israel, é a desgraça: Jordânia, Egito ou Síria continuam antros de repressão. Os 55 artistas, que deveriam defender a liberdade de expressão como quem defende o oxigênio, assinam uma carta contra o único país que respeita essa liberdade em todo o Oriente Médio.

E sobre os direitos humanos? Fato: Israel merece várias linhas de condenação nos relatórios anuais da Human Rights Watch, outra ONG independente. Mas nada que se compare ao comportamento dos mesmos países do Oriente Médio, para não falar da vizinhança em volta.

Um bom indicador do respeito pelos direitos humanos está no tema clássico da pena de morte. Israel aboliu-a para crimes civis. Do Egito à Jordânia, do Líbano à Autoridade Palestina, a execução judicial continua a verificar-se.

Digo “judicial” porque o Hamas, todos o sabemos, prefere fazer as coisas de forma “extrajudicial”, fuzilando traidores no meio da rua.

De resto, será preciso dissertar sobre a diferença entre os “direitos” das mulheres ou dos homossexuais em Israel e nos países em volta? Será preciso recordar o histórico de amputações de membros e lapidações de adúlteras que existe por aquelas bandas?

E será preciso acrescentar alguma coisa à selvageria do Estado Islâmico do Iraque e do Levante, que pelo visto não incomoda os 55 artistas da Bienal de São Paulo?

Criticar Israel é legítimo. Nenhum governo está acima da crítica. Transformar Israel em pária internacional é uma forma de cegueira antissemita.

Eu só respeitarei a “coragem” dos 55 artistas no dia em que eles viajarem para Bagdá, Riad ou Gaza e escreverem uma carta contra os governos locais. Em defesa da liberdade e dos “direitos humanos”. Isso, claro, se ainda tiverem mãos para escrever.


João Pereira Coutinho, escritor português, é doutor em Ciência Política. É colunista do ‘Correio da Manhã’, o maior diário português. Reuniu seus artigos para o Brasil no livro ‘Avenida Paulista’ (Record) e é também autor do ensaio ‘As Ideias Conservadoras Explicadas a Revolucionários e Reacionários’ (3 Estrelas). Escreve às terças na versão impressa e a cada duas semanas, às segundas, no site.

Fonte: Folha de São Paulo


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ISRAEL NA 31ª BIENAL

O Estado de Israel e seu Ministério de Relações Exteriores cooperam de longa data com a Bienal de São Paulo e obras israelenses são exibidas em cada uma das Bienais realizadas.

Alguns meses atrás, curadores da Bienal se dirigiram ao nosso Ministério, solicitando a participação de Israel, como sempre tem sido feito – e paralelamente examinar as possibilidades de Israel contribuir financeiramente à Bienal. Israel propôs certa quantia como contribuição, os curadores solicitaram examinar um aporte maior e Israel acedeu a este pedido também.

Alguns dias antes da inauguração da Bienal, foi publicado um manifesto de um grupo dos artistas, apoiado depois por determinados curadores, parte deles, aqueles que se dirigiram a Israel, para solicitar sua contribuição financeira.

Israel considera a atitude expressa no manifesto e o apoio desses curadores, como uma iniciativa nefasta, contra- producente, nociva e moralmente condenável, que pretendia prejudicar, boicotar e discriminar um estado participante da Bienal. Esta iniciativa é negativa para a arte e a cultura, que os artistas da Bienal pretendem apreciar e proteger, pois a arte e a cultura são linguagens universais, que não conhecem limites e fronteiras.

Eles podem e devem aproximar povos e segmentos sociais, políticos e outros: a atitude dos artistas e dos curadores causou prejuízo a estes mesmos princípios, ao prestígio da arte e da cultura em geral e aquele da Bienal, em particular.

Política e cultura não devem se misturar e não se deve utilizar e se aproveitar da cultura para atingir fins políticos. A Bienal se realiza para expressar e dar um espaço adequado e importante para a arte e a cultura – as lutas políticas se devem fazer nos foros políticos nacionais e internacionais adequados, que foram constituídos para esses fins.

A tentativa frustrada dos artistas assinantes, com o apoio dos curadores que assim se manifestaram, de “sequestrar” a Bienal para fins políticos -é.

inaceitável e é contra os princípios que devem reger estes importantes eventos culturais internacionais.

O Consulado Geral de Israel em São Paulo agradece ao Presidente da Fundação Bienal de São Paulo, Dr. Luis Terepins, ao Conselho da Bienal e a todos aqueles que se esforçaram para chegar a uma solução viável para todos e permitiram a realização da Bienal, com a participação de todos os países e outros sponsors do evento, contribuindo assim para salvaguardar a Bienal dos prejuízos que a atitude daqueles artistas e curadores que apoiaram esta tentativa abortada e frustrada, poderia ter acarretado.

Nota: Matéria enviada à este portal pelo Consulado Geral de Israel em São Paulo


 

OS 55 ARTISTAS QUE REPUDIARAM O APOIO DE ISRAEL À BIENAL DE SP

Em carta aberta à Fundação Bienal de São Paulo, 55 artistas repudiaram o apoio que Israel deu ao evento, em carta aberta publicada no Estadão, aqui transcrita para conhecimento da nossa comunidade. É bom que seus nomes sejam anotados e que as pessoas façam uma reflexão quando pensarem em investir em arte.

EM CARTA ABERTA, ARTISTAS REPUDIAM APOIO DE ISRAEL À BIENAL DE SÃO PAULO

Mais de 50 nomes assinam o documento, pedindo que Fundação recuse verba do governo israelense – Celso Filho – O Estado de S. Paulo

Às vésperas da inauguração da 31ª Bienal de São Paulo, um grupo de 55 artistas de diferentes países publicou uma carta aberta à Fundação da Bienal, pedindo que a instituição recuse o apoio financeiro de Israel ao evento. A carta foi postada na página oficial no Facebook do artista plástico, escritor e arquiteto libanês Tony Chakar.

“Ao aceitar esse financiamento, o nosso trabalho artístico exibido na exposição é prejudicado e, implicitamente, usado para legitimar agressões e violação do direito internacional e dos direitos humanos em curso em Israel”, explica a carta.

Todos os artistas que assinaram a carta terão trabalhos expostos na Bienal, que abre oficialmente para o público no dia 6 de setembro.

Confira a íntegra da carta:

Carta aberta à Fundação Bienal de São Paulo,

Nós, os artistas abaixo assinados participantes da 31 Bienal fomos confrontados, às vésperas da abertura da exposição, com o fato de que a Fundação Bienal de São Paulo aceitou dinheiro do Estado de Israel e o logo do Consulado de Israel aparece no pavilhão da Bienal, em suas publicações e em seu website.

Numa época em que o povo de Gaza volta para os escombros de suas casas, destruídas pelo exército israelense, não sentimos que seja aceitável receber patrocínio cultural israelense. Ao aceitar esse financiamento, o nosso trabalho artístico exibido na exposição é prejudicado e, implicitamente, usado para legitimar agressões e violação do direito internacional e dos direitos humanos em curso em Israel. Rejeitamos a tentativa de Israel de se normalizar dentro do contexto de um grande evento cultural internacional no Brasil.

Com essa declaração, nós apelamos à Fundação Bienal de São Paulo para recusar esse financiamento e agir sobre esse assunto antes da abertura da exposição.

1. Agnieszka Piksa

2. Alejandra Riera

3. Ana Lira

4. Andreas Maria Fohr

5. Asier Mendizabal

6. Coletivo Chto Delat: Dmitry Vilensky, Tsaplya Olga Egrova e Nikolay Oleynikov

7. Danica Dakic

8. Débora Maria da Silva (Movimento Mães de Maio)

9. Erick Beltran

10. Etcétera…, Federico Zukerfeld e Loreto Garin Guzman

11. Farid Rakun

12. Francisco Casas e Pedro Lemebel (Yeguas del Apocalipsis)

13. Gabriel Mascaro

14. Graziela Kunsch

15. Grupo Contrafilé

16. Gulsun Karamustafa

17. Halil Altindere

18. Heidi Abderhalden

19. Imogen Stidworthy

20. Ines Doujak

21. Jakob Jakobsen

22. John Barker

23. Jonas Staal

24. Lia Perjovschi e Dan Perjovschi

25. Liesbeth Bik e Jos van der Pol

26. Lilian L’Abbate Kelian

27. Loreto Garin

28. Luis Ernesto Díaz

29. Mapa Teatro – Laboratório de Artistas

30. María Berríos

31. Maria Galindo & Esther Argollo (Mujeres Creando)

32. Mark Lewis

33. Marta Neves

34. Michael Kessus Gedalyovich

35. Miguel A. López

36. Nilbar Güres

37. Otobong Nkanga

38. Pedro G. Romero (Archivo F.X.)

39. Prabhakar Pachpute

40. Rolf Abderhalden

41. Romy Pocztaruk

42. Ruanne Abou-Rahme Basel Abbas

43. Sandi Hilal e Alessandro Petti

44. Santiago Sepúlveda

45. Sergio Zevallos

46. Sheela Gowda

47. Tamar Guimarães e Kasper Akhøj

48. Thiago Martins de Melo

49. Tiago Borges

50. Tony Chakar

51. Voluspa Jarpa

52. Walid Raad

53. Ximena Vargas

54. Yael Bartana

55. Yonamine


 

Fonte: O Estado de S. Paulo – matéria publicada dia 29 de agosto de 2014.

Nota do portal: É importante que os nomes destes artistas sejam anotados e que as pessoas da nossa comunidade pensem bem antes de comprar suas obras.

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