LIÇÕES JUDAICAS PARA TEMPOS DE CRISE – POR PAULO MALTZ

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Em épocas de vacas magras, o trabalho assistencial e comunitário é ainda mais imprescindível.


Como todos os brasileiros, os judeus também foram atingidos pela grave crise por que passa o país. Desemprego, inadimplência, diminuição de renda e dificuldade em manter negócios abertos tornaram-se temas recorrentes em nossa comunidade.

Em tempos difíceis como estes, os judeus costumam recorrer à sua história e às suas tradições em busca de conforto e esperança. Lembramos a penúria em que vivia a maioria de nossos antepassados antes de partirem para o Brasil e de como chegaram aqui sem um tostão no bolso e sem falar uma palavra sequer na língua local.

Aqui no Rio de Janeiro, eles se espalharam pelo Centro, subúrbios e Baixada. Trabalharam, progrediram e, aos poucos, deixaram a pobreza para trás. Cada judeu que hoje vê seu padrão de vida cair por causa da crise tem pais ou avós que passaram por tempos muito mais difíceis e que perseveraram, superaram barreiras e construíram os alicerces do que é hoje a nossa comunidade. Sua história, como indivíduos e como coletividade, tem muito a ensinar não apenas a nós, mas a todos os brasileiros.

Uma lição que podemos tirar é que, em épocas de vacas magras, o trabalho assistencial e comunitário é ainda mais imprescindível. Ninguém está tão pobre que não possa contribuir para alguma causa comunitária, seja com recursos ou trabalho voluntário.

O trabalho comunitário em tempos de crise gera um duplo benefício. Ele auxilia aqueles mais vulneráveis, como crianças e idosos, e estimula a união e a cooperação entre os membros da comunidade. São comuns, durante eventos beneficentes em nossas instituições, os contatos entre voluntários que acabam gerando propostas de trabalho, parcerias e novos negócios.

Outra lição valiosa é que, por mais que a crise esteja nos afetando, devemos sempre pensar à frente dela. Estamos falando aqui do compromisso inabalável que sempre tivemos com a educação de nossos filhos. Nos modestos lares dos judeus que aqui chegaram no início do século passado, podia faltar quase tudo, menos livros e jornais.

Seguindo este exemplo, hoje evitamos todas as despesas adiáveis, para que não seja preciso fazer cortes na educação das crianças. E quando eles são inevitáveis para alguns pais, a comunidade entra em cena, cotizando-se para que nossas escolas ofereçam o maior número possível de bolsas de estudos. Fazemos isso porque assim ensinaram os que vieram antes de nós: quando a crise acabar, novas oportunidades surgirão e é preciso estar preparado para aproveitá-las.

O Brasil tem imensas riquezas e uma delas é a experiência trazida por imigrantes, como os judeus, no enfrentamento e superação de crises. Neste momento difícil por que passa o país, este conhecimento acumulado através dos séculos pode ser de extrema utilidade a todos os brasileiros.

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Paulo Maltz é Presidente da FIERJ – Federação Israelita do Estado do Rio de Janeiro


Fonte: O Globo – Opinião – 05 de outubro de 2015.

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