ESPECIALISTA ISRAELENSE ABORDA O CONFLITO DE VALORES NO JUDAÍSMO
Para Cohen, o entendimento do conceito de valores é fundamental para a educação judaica, “sobretudo quando grupos judaicos acham que têm o monopólio dos valores, quando o que têm são apenas interesses”.
Jonathan Cohen, diretor do Melton Centre for Jewish Education da Universidade Hebraica de Jerusalém, ministrou em 7 e 11 de setembro atividade de capacitação para dezenas de educadores no Rio de Janeiro e em São Paulo, com o tema “A complexidade e os desafios da vida atual à luz dos conflitos existentes nas fontes judaicas”. A iniciativa foi da Conib, com o apoio da Agência Judaica, Pincus Fund e Instituto Samuel Klein.
Para Cohen, o entendimento do conceito de valores é fundamental para a educação judaica, “sobretudo quando grupos judaicos acham que têm o monopólio dos valores, quando o que têm são apenas interesses”.
Leia a seguir um resumo da palestra:
O conceito de valores
Valores são um conceito moderno. “A palavra não existia para nossos antepassados, que usavam mitzvot [mandamentos] ou midot [virtudes]”, afirma Cohen.
“Antes, havia sensação de obrigação, ordem, dada por uma voz externa, superior. Hoje, o homem precisa avaliar, e a sensação é de uma voz interna”.
“Os gregos também falavam de virtudes. Platão referia-se aos valores da natureza, e cada coisa tinha uma essência. Se, para os gregos, os valores estavam na natureza, para os judeus, estavam em Deus. No mundo contemporâneo, o homem e sua experiência são a fonte dos valores. Mas é legítimo fazer isso?”.
Polos da discussão contemporânea
“Hoje, a discussão no judaísmo se dá entre dois campos: autenticidade e relevância. Se quero ser autêntico, mantenho a fidelidade às fontes ou faço o agenciamento delas. Por outro lado, se eu falar na linguagem dos alunos (ou na nossa), posso fugir do texto. A tradução da tradição é o que fazemos. E não é algo apenas técnico. Será uma traição?”
“Assim, tenho duas alternativas: 1) ser, como o shofar, um instrumento, ainda que cause distorção; 2) fazer a tradução, que será sempre parcial”.
Três formas de abordagem dos valores no judaísmo
1) Afirmação dos valores
“’Estes são os valores. Siga-os!’. Essa abordagem funciona nas sociedades homogêneas, em que se conhecem as pessoas que representam tais valores. O sábio, a pessoa ideal, é aquele que faz as pessoas tirarem de si aquilo que têm de melhor. Isso não ocorreria sem o exemplo dele. Nessa sociedade, há consenso: os valores não estão em conflito. O combate à inclinação do homem ao mal se dá via mitzvot e exemplos próximos”.
2) A imposição de valores é proibida
“Nessa visão, só o próprio individuo pode definir seus valores. O homem tem a ‘liberdade’ de traçar uma escala de valores, desde que não prejudique o outro. Não é ‘humanista’ colocar os valores dentro de um molde. E a educação se dá via dilemas: o aluno olha suas próprias pegadas. Assim, poderá se entender melhor.
Como vemos, as posturas 1 e 2 são quase extremas”.
3) Conflito entre valores
Cohen apresenta seu pressuposto: “A educação para uma cultura é questão humana, não reflete uma obrigação, pois dou a quem eu quero aquilo de que gosto. Funciona assim nas famílias, nos povos, na transmissão entre as gerações. Este é o gesto mais natural. Não há o indivíduo puro. Vivemos dentro de grupos e culturas, com padrões de pensamento”.
E lança perguntas: “Como fazer com que o aluno não seja passivo? Combinando o cultural com o individual?”.
Três patamares de conflito entre os valores
1) conflito absoluto: determinados valores são inegociáveis para qualquer judeu.
“Exemplo: o judeu não pode obedecer a outro Deus. A oposição a Deus e à santificação da vida não são negociáveis, são valores coletivos absolutos”.
“Mas mesmo estes valores têm que ser colocados à prova, em questões concretas”, afirma Cohen, dando como exemplos o uso da pena de morte e o retorno dos Anussim ao judaísmo.
2) valores sociais em conflito: verdade, justiça, paz, Shabat
Exemplo: “Num tribunal, pode haver compromisso entre paz e justiça. Quando os valores se aplicam na vida real, precisamos entender o que os sábios disseram”
3) conflito entre valores e instintos
“Quem já não passou por isso?”.
Revital Poleg e Jonathan Cohen
Jonathan Cohen no Rio de Janeiro
Mais de 80 educadores participaram do encontro