QUANDO TRÊS DESTINOS SE ENCONTRAM POR COMANDO DOS CÉUS – POR JAYME VITA ROSO

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No dia 14 de setembro de 2016, bem longe de Paris e folheando o Le Monde, vi a notícia do falecimento de Claude Jean Phillipe (aliás, Claude Nalborn, de humilde família judia). Mas não era a única estampada naquele jornal. Refiro-me, com grande tristeza, ao falecimento do Doutor Jean Raphael Hirsch e, na mesma edição, um dia após Hirsch ter falecido, pouco conhecida, mas importante com 98 anos, Lydie Grymberg. Lutadora, conseguiu sobreviver e sair dos campos de Drancy e Vinel, …


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O matutino Le Monde tem uma seção em duas partes que chama “Disparition et Corriet” (na primeira, os avisos de falecimentos, agradecimentos, missas e aniversários; na segunda, nascimentos, batizados e casamentos, inclusive colóquios, conferências, assinaturas, sustentação de trabalhos universitários e teses).

No dia 14 de setembro de 2016, bem longe de Paris e folheando o jornal, vi logo na primeira página, a notícia do falecimento de Claude Jean Phillipe, remetendo-me à página 15. E, lá, encontro uma foto dele de 1986, antiga pois, com um apanhado de sua vida e de sua brilhante carreira de crítico e empreendedor (nasceu em 20/04/1933, em Tanger, Marrocos; em 1971, criou o “Cine-Club” no ORTF; em 1976, “O cinema dos cineastas” na France Culture e, em 11/09/2016, falece).

É sobre Claude Jean Phillipe (aliás, Claude Nalborn, de humilde família judia). Sempre se postou como homem misterioso. E eu o admirava, no segmento do programa do renomadíssimo Bernard Pivot, conhecido como “Apostrophes”, do qual tenho alguns vídeos, inclusive de uma entrevista com Françoise Dolto. Esse programa era um permanente debate literário, onde a sétima arte tinha seu núcleo e de Phillipe, um acolhimento público particular.

Jacques Mandelbaum escreveu o necrológio no Le Monde, destacando que Phillipe, por força dos decretos anti-judaicos do Governo de Vichy, levava, mesmo criança, uma vida de maquis (resistência francesa), tendo colaborado com o desembarque na Normandia em 1942; com 10 anos, descobre a Coca-Cola, para, aos 18 anos, fundar seu primeiro Cine Clube. Em 1954, ingressa no Instituto de Altos Estudos Cinematográficos (IDHEC), para se tornar professor de cinema: sua profunda vocação. Participou, entre 1976 e 1984, do “Clube dos Cineastas” e, posteriormente, durante 20 anos, cada manhã dominical, precisamente às 11 horas, mantinha no cinema Arlequim, em Paris, um programa em que apresentava os lançamentos recentes, seguidos de frutuosos debates, com vigor, sabor, inteligência e rigor técnico.

É uma perda a lamentar, mas não era a única estampada naquele número do Le Monde. Refiro-me, com grande tristeza, ao falecimento do Doutor Jean Raphael Hirsch, conhecido como Nano. Sobre ele, por ele, para ele, neste espaço que me proporciona Glorinha Cohen, escrevi algumas linhas, tendo apreciado seu livro “Acorde, papai, acabou” (Edição Albin Michel, 2014, com o título Réveille-toi, papa, c’est fini).

O Doutor Hirsch, membro atuante em tudo, (além de cirurgião, antigo interno do Hospital de Paris), mereceu a Legião de Honra, no grau de comendador; foi agente de ligação durante a Resistência com 9 anos de idade, membro do Comitê da Resistência; membro da Federação Nacional dos Deportados e Internados da Resistência; Vice-presidente das Crianças Abandonadas (organização); Presidente da Comissão de Solidariedade da Fundação para a Memória de Shoah e Presidente da Associação do Comitê Francês para Yad Vashem.

Com 94 anos, seu passamento se deu em 10/09/2016, deixando uma tristeza profunda em Auvre, Yaël, Michel e Jonathan Hirsch, parentes e filhos. Exumado no famoso Cemitério de Montparnasse, no 14º Arrondissement.

Mas, na mesma edição, um dia após Hirsch ter falecido, pouco conhecida, mas importante com 98 anos, Lydie Grymberg. Lutadora, conseguiu sobreviver e sair dos campos de Drancy e Vinel, enquanto seu marido Jacques Grymberg (morto em 2004), sobreviveu, após deportado de Auschwitz. Impossível não lembrar os episódios do casal e que sempre eram e foram recordados nas reuniões associativas, em 61, Rue des Armandièrs, Paris 20º.

E, nesse local, houve uma prece para ela e seu marido, encomendada por seus familiares, logo após o sepultamento no Cemitério de Père Lachaise, Paris 20º.

Todos deixam saudades imensas, não tristezas.


JAYME VITA ROSO – Graduado pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, é especialista em leis antitruste e consultor jurídico de fama internacional, ecologista reconhecido e premiado, “Professor Honorário” da Universidade Inca Garcilaso de La Vega de Lima, Peru e autor de vários livros jurídicos. Saiba mais.

vitaroso@vitaroso.com.br

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