EM RECIFE, A SINAGOGA KAHAL ZUR ISRAEL, A PRIMEIRA DAS AMÉRICAS – GLORINHA COHEN

Visitar Recife e ser recebida pelo médico e escritor Meraldo Zisman e sua esposa Graça, e ainda ter como guia turístico alguém como o historiador Jacques Ribemboim torna qualquer viagem inesquecível. São pessoas especiais que nos conquistam de pronto, fazendo-nos sentir parte daquele povo tão acolhedor que é o pernambucano e deixando na gente a sensação de não querer mais ir embora.

Recife é a cidade de maior diversidade cultural do país, preservada em museus como o Museu do Homem do Nordeste, Fundação Gilberto Freyre, Instituto Ricardo Brennand, Oficina Cerâmica de Francisco Brennand, Memorial Luiz Gonzaga, Museu de Arte Popular, Casa do Carnaval, Núcleo Afro Brasileiro, Mamam – Museu de Arte Moderna Aluízio Magalhães, Museu da Cidade do Recife e Museu do Estado.

Além dos museus e das praias exuberantes que Pernambuco tem, a Sinagoga Kahal Zur Israel, a primeira sinagoga das Américas do período holandês no Brasil, é ponto turístico obrigatório para se conhecer. Fica na Rua do Bom Jesus, a antiga Rua dos Judeus, e suas instalações compreendem hoje o Centro Judaico de Pernambuco, no centro histórico da cidade.

A data de sua inauguração é incerta, mas consta ter ocorrido entre 1636 e 1640. Ao seu tempo, não muito distante, foi erguida uma segunda sinagoga, a da Congregação Maguen Abraham, na Cidade Maurícia. Não obstante, é bom lembrar que, um século antes, a partir de 1537, já havia sinagogas em Pernambuco, às escondidas da Inquisição, nas casas dos judeus de Olinda e mesmo nos engenhos ao redor.

A Sinagoga Kahal Zur Israel é um importante marco da presença judaica no Brasil. Alguns de seus frequentadores, ainda no século XVII, rumaram para a América do Norte e ajudaram na fundação de um núcleo de povoamento, na ilha de Manhattan. Desta então a pequena New Amsterdã não parou mais de crescer até se transformar na atual cidade de Nova Iorque.

Abaixo você pode saber mais sobre ela.


SINAGOGA KAHAL ZUR ISRAEL (EM HEBRAICO: קהל צור ישראל, “ROCHA DE ISRAEL”)

Histórico

O Nordeste do Brasil foi a “Terra Prometida” para cristãos-novos e judeus ibéricos nos séculos XVI e XVII. Empurrados pela Inquisição, forçados à conversão, muitos decidiram atravessar o oceano desconhecido em busca de paz e de liberdade de culto. Tiveram importante papel no início da ocupação portuguesa nas novas terras, criando ou se inserindo em diversas atividades. Em especial, na produção e comércio do açúcar.

A ocupação holandesa no Recife trouxe grande número de judeus portugueses de Amsterdã. Com eles, inúmeros cristãos-novos e descendentes que já viviam no Recife retornaram ao judaísmo, formando algumas congregações. Entre elas, a Kahal Zur Israel, Primeira Sinagoga das Américas.

Em dezembro de 2001, o prédio original reconstituído foi aberto ao público, sendo hoje um dos mais importantes sítios turísticos da região. A edificação é a parte visível do que foi uma comunidade que atingiu 50% do total de habitantes de origem européia da época, deixando marcos da sua presença em muitos lugares.

A formação da comunidade

A formação de uma comunidade judia em Pernambuco ocorreu efetivamente na primeira metade do século XVII, graças à liberdade religiosa durante o governo holandês, comandado por João Maurício de Nassau. Durante seu governo de sete anos (1637-44), ocorreu uma contínua imigração de judeus. Além da motivação principal, que era a religiosa, também havia uma razão econômica para a imigração, já que os judeus portugueses que viviam em Amsterdã tinham fortes laços econômicos com negociantes holandeses. Com 600 famílias, a comunidade judia de Recife se completou com a chegada do famoso líder religioso, Rabino Isaac Aboab da Fonseca, mandado pela Congregação de Amsterdã. Foi então que a congregação Kahal Zur Israel e a construção da primeira sinagoga das Américas ocorreu. No mesmo momento, foram construídas as escolas religiosas Talmud Torah e Etz Hayim, que ficavam localizadas em edifícios multi-níveis. Também havia um cemitério judeu, fora dos limites da cidade, onde hoje está a comunidade dos Coelhos.

Com o declínio do governo holandês, em 1654, e a reinstituição do regime português, a comunidade judaica de Recife teve três meses para vender seus pertences e ir embora em quaisquer navios disponíveis. Uma pequena parte dessa população foi em direção ao Caribe e América do Norte, onde estabeleceram um lugar chamado de Nova Amsterdã, constituindo a primeira comunidade judaica organizada naquela região. Este lugar é hoje conhecido como a cidade de Nova Iorque.

O lugar onde a primeira sinagoga das Américas estava situado foi recentemente identificado e sua estrutura localizada, embaixo de grandes casas, do número 197 ao 203, na Rua do Bom Jesus, antigamente conhecida como Rua dos Judeus, no Recife Antigo. A construção foi demolida no começo do século XX, sendo substituída, primeiro, por um banco e, depois, por uma loja para equipamentos elétricos.

O Mikvah e os achados arqueológicos

Setecentas toneladas de terra e mais de mil metros quadrados de emboço foram removidos para se determinar o layout interno exato, identificando as mudanças feitas ao longo dos séculos na construção onde a primeira sinagoga do hemisfério oeste foi situada. Escavações revelaram oito diferentes níveis de piso – correspondendo aos sucessivos níveis da cidade -, as fundações da sinagoga e os restos de mudanças subsequentes feitas na construção. Durante as escavações, alguns materiais arqueológicos foram encontrados, incluindo fragmentos de canos holandeses, pratos e outros elementos que retratam o vida cotidiana da cidade durante aquele período. Um buraco no formato de uma piscina achado dentro da construção onde estava localizada a sinagoga se tornou na descoberta mais importante durante as escavações arqueológicas.

Trabalhos seguintes também revelaram a estrutura de um poço, feito de pedras, uma sobre a outra, sem argamassa, com 1,7 m de profundidade e aproximadamente 70 cm de diâmetro. Dois meses depois, uma comissão de quatro rabinos partiu para o Recife para inspecionar o lugar. Apenas então esse grupo de rabinos brasileiros e argentinos confirmou a descoberta do ritual judeu do Mikvah – um banho para fins de purificação. De acordo com os rabinos, especialistas no assunto, as dimensões estão em conformidade com a tradição judaica. Os rabinos categoricamente afirmam que o Mikvah é o mais importante aspecto da sinagoga e uma das fundações básicas de qualquer comunidade judaica, independente de sua localização. “É no Mikvah que homens e mulheres se purificam diante de Deus”, explicam.
Com a restauração vem a memória do passado

Graças à sua importância para a história dos judeus no Nordeste brasileiro, o projeto escolhido para a restauração das construções onde estava a Sinagoga Kahal Zur Israel teve como principal meta preservar a harmonia estética com um objetivo histórico. Por isso, os elementos arqueológicos descobertos – que são de grande importância – foram ressaltados, sem, entretanto, se transformarem em material de exibição pública. A intervenção também não determinou o período histórico do prédio, mas mostrou as várias etapas das construções em questão. As construções de hoje são resultados acumulados de sucessivas modificações.

Por conta da falta de definição de alguns elementos construídos, o prédio não foi restaurado de volta à sua aparência original do século XVII. Ainda que os estudos tenham sido intensos, o layout original do telhado e de outras áreas internas não puderam ser discernidas, como o tipo de teto da sala de oração ou a parede na parte de trás do edifício. Por outro lado, as escavações arqueológicas expuseram um rico legado abaixo do atual nível da rua. Deixar todas essas descobertas enterradas embaixo do chão ou atrás de muros emboçados não seria lógico. Com isso, o objetivo principal é associar o interesse nessas descobertas arqueológicas com o uso do edifício como um centro de documentação e um memorial judeu, simplesmente reconstituindo a fenda cultural existente a fim de aumentar a importância histórica e artística do local.


Fonte: www.kahalzurisrael.com
Colaboração: Jacques Ribemboim
Fotos: Glorinha Cohen

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