ROSH HASHANA – YOM KIPPUR 5775/2014 – POR BERNARDO SORJ

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Pois só quando deixamos de falar, fazer ou digitar, entendemos que valorizamos demais o que não é essencial. E que a vida é um esforço constante de superar nossa onipotência narcisista e desenvolver nossa capacidade de aprender, compreender e discernir.


Em Rosh Hashana refletimos sobre a passagem do tempo, lembrando que estamos todos imersos na mesma travessia.

Porque viver é fazer, e quem faz erra.

Porque viver é acreditar, e quem acredita se ilude.

Porque viver é amar, e quem ama sofre.

Porque ninguém escolheu nascer.

Nem a época, lugar ou família.

Nem morrer.

Porque não controlamos o futuro.

Nem podemos prever as consequências de nossos atos.

Porque um dia temos saúde e outro dia estamos doentes.

Porque um dia triunfamos e outro dia fracassamos.

Porque temos que conviver com sentimentos de ansiedade sobre o futuro e com o desejo de que os outros se adaptem a nossa vontade e a nossa forma de ver o mundo.

Temos que ter compaixão por nós mesmos e pelos outros.

Em Yom Kippur lembramos as palavras do profeta Isaias que diz que não é o jejum que purifica as pessoas, mas nossos atos de solidariedade.

Por isso o perdão deve ser procurado naqueles que prejudicamos e humilhamos.

Não permitindo que projetemos nossos conflitos internos, nem enxerguemos os outros pelo filtro de nossas inseguranças.

Sem perder o senso de humor e ironia, sem os quais nossa vida e a da que nos rodeiam se torna opressora.

Nem que nossas obsessões e a procura de poder, dinheiro e prestigio, nos empobreçam, criando a ilusão que controlamos a realidade ou que somos melhores que os outros.

Lembrando que as qualidades humanas nada têm a ver com o lugar em que nos encontramos na escada social, e que o sucesso e a riqueza podem empobrecer nossa sensibilidade.

Por isso em Rosh Hashana e em Yom Kippur ficamos mais tempo em silêncio e procuramos esvaziar nossa mente. Pois só quando deixamos de falar, fazer ou digitar, entendemos que valorizamos demais o que não é essencial.

E que a vida é um esforço constante de superar nossa onipotência narcisista e desenvolver nossa capacidade de aprender, compreender e discernir.

Porque a tradição judaica se alimenta de uma história milenar que nos ensina que preconceitos, injustiças e o sofrimento produzido pela sociedade são inaceitáveis, e que corresponde em cada ano e a cada um encontrar sentido na celebração de Rosh Hashana e Yom Kippur, agradecemos:

Shehechyanu, ve´quimanau ve’higuianu lazman haze.

Que vivemos, que existimos, que chegamos a este momento.


BERNARDO SORJ – Nascido no Uruguai e naturalizado brasileiro, o sociólogo Bernardo Sorj tem interesse particular por temas ligados à América Latina. Diretor do Centro Edelstein de Pesquisa Social, voltado para o fortalecimento das democracias latino-americanas, atualmente ele se dedica também ao estudo “O Conflito no Oriente Médio: Alcances e Limites da Política Exterior do Brasil”, projeto que está desenvolvendo como professor visitante do IEA.Sorj é graduado em história e sociologia pela Universidade de Haifa, Israel, onde também cursou o mestrado. É doutor pela Manchester University, Inglaterra, e pós-doutor pela École des Hautes Études en Sciences Sociales, França. Ele também é professor titular aposentado da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).