A PREGUIÇA COMO VIRTUDE – POR AKIM ROHULA NETO

272_life_2_1Hoje, temos acesso simples a tantos aspectos que tornar-se preguiçoso e deixar as coisas para depois é um comportamento que se torna possível.


Olá querido leitor! Você já sentiu aquela preguiça de fazer algo que você precisava? O desejo forte em deixar para depois aquilo que precisava ser feito agora (ou que já deveria estar feito) torna-se cada vez mais comum em nossa sociedade, o que compreender das raízes desta “massificação da preguiça”?

Um pontapé inicial é apontar o dedo acusador para as comodidades da vida moderna. Hoje, temos acesso simples a tantos aspectos que tornar-se preguiçoso e deixar as coisas para depois é um comportamento que se torna possível. O caçador não podia deixar para ir caçar outro dia sob risco de fome, a existência de postos e supermercados 24 horas acabam com este problema.

Porém, a comodidade por si só, não gera preguiça visto que ela também traz consigo a necessidade de poder utilizar-se das comodidades (a roda só era útil para quem tinha uma). Assim o ato de entregar-se à um estado de torpor permitindo que nossos compromissos passem por nós enquanto acenamos tem outras raízes.

As principais delas, me parece, são a falta de crença em uma sociedade funcional e a vitimização que se torna uma “virtude em si”. A falta de crença em uma sociedade funcional tem como fórmula a ideia de que o mundo não é perfeito, nunca será e, por este motivo, de que adianta, realmente fazer tanto esforço?

Este niilismo infantil detém grande atenção do público hoje em dia, especialmente dos jovens. Porém, se o argumento é válido, o mesmo deveria ser empregado para as partes boas da vida também (afinal de contas se a vida como um todo não tem sentido, nem estudar para a prova e nem ir para a balda tem sentido). Porém, o preguiçoso, apenas verifica a primeira parte da equação.

Por que? Para compreender temos que recorrer à vitimização. Como nossa sociedade não funciona, todos somos pobres vítimas de imperadores tiranos que não pensam no nosso bem-estar, apenas no deles. A vitimização não para por aí, ela também tem se confundido em nossa sociedade de maneira perversa.

A “vítima” de fato caracterizada por uma pessoa ou grupo de pessoas submetidas à uma situação coercitiva sobre a qual não detinham nenhuma força para agir contra é substituída, lentamente, pela “vítima do cotidiano”, ou seja, todos nós que sofremos frustrações, decepções e contrariedades em nossas vidas.

Tornamos condições de vida tais como problemas de relacionamentos uma situação de vitimização. É fato: algumas situações realmente nos deixam impotentes, porém existe uma diferença enorme entre vítimas reais e nós que ainda que cambaleantes continuamos nossos caminhos. As vítimas de situações realmente vitimatórias, dificilmente sobrevivem para contar a história.

Portanto, já que o mundo nos oprime e nada de fato tem sentido precisamos lidar com o pouco de liberdade que temos para buscar aquilo que é mais importante: o prazer. A conclusão de que o niilismo deve levar à boemia só nasce de uma percepção vitimatória do mundo, pois um niilismo real também negará o prazer.

Esta combinação desemboca na preguiça por ser a maneira mais interessante de gerar prazer: o preguiçoso diz um não (muito birrento e imaturo) ao mundo que o obriga a fazer aquilo que não quer e arrancá-lo da perfeita contemplação do nada ao que se submete, geralmente, sob o uso de drogas ou, modernamente, da virtualidade que nos permite outra escapada da realidade.

Para esta percepção do mundo a preguiça não é apenas fonte de prazer, mas uma virtude amplamente enaltecida enquanto escape da única coisa que de fato aterroriza o preguiçoso: a realidade e a necessidade de agir sobre o real.


AKIM ROHULA NETO – Graduado em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Saiba mais.

akim@uol.com.br

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