SONHO OU PESADELO – POR OSIAS WURMAN

297_especial_3_1Nazismo está vivo em vários cantos do mundo!


Sonhei com a hipótese messiânica em que meus avós David e Oscar renasceram nos dias de hoje. Ambos eram poloneses e fugiram de sua terra natal para o Brasil, devido ao insuportável antissemitismo que vigia na Polônia na década de 30.

Veriam contrastes inimagináveis com o que era a realidade judaica, há uns 40 anos passados, quando ambos partiram deste mundo. Estariam presenciando o surpreendente renascer do judaísmo na Polônia, onde cerca de 20 mil judeus voltaram a viver.

Vale lembrar que, antes da Segunda Guerra Mundial, os judeus poloneses totalizavam cerca de 3,2 milhões de pessoas e, após o conflito, sobreviveram apenas 200 mil.

Outro marco surpreendente é o Museu da História dos Judeus Poloneses, cuja inauguração, em Varsóvia, ocorreu em 2013. Fica no local onde existiu o maior gueto judaico, o Gueto de Varsóvia, instituído pelos nazistas, sendo atualmente o maior museu do país, retratando com real grandiosidade o que foram os mil anos da vida judaica na Polônia.

Atualmente, há mais de 100 sinagogas funcionando, e os poloneses são os maiores exportadores de comida kosher da Europa, que segue o ritual religioso judaico de preparação. O maior destino destes produtos é o Estado de Israel.

Uma situação alarmante para meus antepassados seria assistir — nas ruas da nação que abriga a maior população judaica fora de Israel, os EUA, com seis milhões de judeus — a manifestações de americanos carregando bandeiras com a suástica e gritando “fora judeus” em meio à famigerada saudação nazi de “Heil Hitler”.

Como pode a maior nação democrática do mundo conviver com gente racista, que até coloca em risco a convivência pacífica nacional? Estes tristes e repugnantes acontecimentos provam que Hitler morreu, mas o nazismo está vivo em vários cantos do mundo!

Já com relação ao Brasil, meus avós certamente teriam orgulho da iniciativa que um jovem político judeu, o vereador Marcelo Arar, ao dar uma moção de solidariedade ao imigrante sírio Mahmoud Ali, vendedor ambulante que foi agredido e xingado em plena Copacabana, com termos xenofóbicos que não condizem com a hospitalidade do povo brasileiro.

Meus avós, assim como uma grande parcela da comunidade judaico-brasileira, também foram imigrantes que chegaram a esta terra maravilhosa e começaram a vida como vendedores ambulantes de mercadorias. Nossos antepassados foram os criadores do sistema prático das vendas a prestação. Aqui casaram os filhos, criaram família, netos e bisnetos, todos plenamente integrados à sociedade maior e desempenhando as mais diversas funções profissionais.

Em resumo, teriam motivos para alegria com o inimaginável renascimento da vida judaica na sua terra natal, a Polônia, com o gesto de solidariedade judaica do jovem político carioca e uma profunda preocupação com o futuro da exemplar, mas dividida, sociedade americana.

Será que meu sonho seria um pesadelo para meus avós?

Osias Wurman é cônsul honorário de Israel no Rio de Janeiro

Nota; matéria publicada no jornal O Globo