ALBERTO MANGUEL: UM ESCRITOR UNIVERSAL – POR JAYME VITA ROSO

300_especial_2_1“O mundo de hoje é uma só sociedade de consumo que, para funcionar, deve educar o cidadão a não pensar. Os valores são apenas aqueles da facilidade, da rapidez, do banal”.


300_especial_2_2Foto: David Levenson / Getty Images

Ocupo-me, neste artigo, de um judeu argentino, Alberto Manguel (1948), que reparte sua vida como romancista, ensaísta, tradutor e editor. Exilou-se do país natal, após nele ter estudado e após passar a infância em Israel, até naturalizar-se canadense. Escreveu cinco romances, participou de quinze antologias e publicou, entre 1980 e 2015, dezoito títulos de não ficção (abordou Frankenstein, Pinocchio e Homero, além de enfrentar temas imaginários, quem sabe transmitidos por Borges e com quem partilhou momentos importantes: iam ao cinema e “narrava” ao amigo-cego o que sucedia na tela).

Provocativo, nos romances, reviveu Stevenson e, entre “Um amante extremamente minucioso” pode surfar com “Todos os humanos são mentirosos”. Nas obras de não ficção, fustigou a memória de Kipling, com uma biografia ousada; com Borges (With Borges), retroage à memória portenha e com “At themadhatter’stable”, traz Erasmo, ao mundo da precisão, mas tambémda inconsistência e do relativismo. Alguns autores, discutem a sua grandeza e o catalogam no movimento dopós-modernismo.

Após viver também na Espanha, na França, na Inglaterra e na Itália, mesmo adotando a nacionalidade canadense, aceitou ser diretor da Biblioteca Nacional, em Buenos Aires. Em 2014, pronunciou conferência em São Paulo (A Biblioteca do Inferno) e em Porto Alegre (A Biblioteca Imaginária).

Num passar de olhos, percebe-se que os livros, as leituras, as viagens imaginárias traçam o perfil deste escritor universal (vencedor do Prêmio Medicis em 1998), porque, “malgré tout”, com a nacionalidade canadense no passaporte, a França escolheu para viver e, numa pequena cidade do interior, tem sua casa com uma biblioteca de cerca de 30 mil livros!

Até agora, narrei o homem, o escritor, o peripatético, com tintas leves como é de rigor. Agora, depois de ter adquirido seis títulos proclamo que Manguel é um curioso: leitor ávido e assíduo e amante da Divina Comédia, que considera um livro infinito: homem de destaque deste mundo contemporâneo que respeita o seu leitor (1).

Relevo, de uma entrevista a Arnaldo Bloch, em 20/08/2016, a pesquisa que foi respondida, sobre um tema que me fascina e angustia: educação.

“O que é educar, hoje?

O mundo de hoje é uma só sociedade de consumo que, para funcionar, deve educar o cidadão a não pensar. Os valores são apenas aqueles da facilidade, da rapidez, do banal. Essa educação necessariamente se opõe à inclinação natural do ser humano que é a de parar, refletir, levar a curiosidade ao fundo. Apesar do esforço de alguns professores, prevalece o impedimento à reflexão. Nossos centros de estudo não são mais escolas: são centros de adestramento para criar escravos que devem cumprir certas funções no seio de uma usina. Estamos no modelo de Chaplin em Tempos modernos. Isso permite que uma máquina econômica falida e infernal continue a nos engolir e se alimentar do sangue de nossos filhos, chamada “modelo econômico”. (2)

Sua “magna opus” (como era usual dizer-se nos meios intelectuais, quando se utilizava latim como fonte raciocínio e impulsionador cultural) é “ História da Leitura”(3). Aclamada em todos os recantos do mundo ocidental, apresenta o impacto de que, no início, o autor se reporta à última página e, no final, em inglês, “endpaperpages”, como não se imaginaria diferente. Simetricamente, utilizou “na introdução fim”, vinte e quatro páginas e, no final, catorze páginas.

Provoca o leitor, com portentosa bibliografia de 431 títulos utilizados e comprovados no texto da edição em inglês ³ (“Uma história da leitura”, edição da Companhia das Letras).

Se o intelectual está em extinção, como afirmou, se o homem é o que já leu, acompanho com alegria o que, na Revista New Yorker, George Steiner, escreveu; “Manguel é uma companhia generosa… ele permanece, no exato sentido da palavra, um “amador”, um amante em lugar do que um especialista”.

1) Ao leitor ávido por conhecer outras facetas do escritor e do homem, Alberto Manguel, remeto:

1.1- Alberto Manguel: “Somos os livros que já lemos”– ZH Caderno PrOA, 01/11/2014;

1.2- A curiosidade inspira a nova obra de Alberto Manguel, que vem a SP para o lançamento – Estadão, 27/08/2016;

1.3- O intelectual está em extinção, diz escritor Alberto Manguel – Folha de São Paulo, 30/08/2016;

1.4- Alberto Manguel: cérebro paradoxal – David levenson/ Getty Images – O Globo, 28/08/2016.
https://oglobo.globo.com/cultura/livros/novo-livro-de-alberto-manguel-conta-historia-da-curiosidade-guiado-por-dante-alighieri-20001556]

2) Destaque da entrevista, por Arnaldo Bloch – O Globo, 28/08/2016.
https://oglobo.globo.com/cultura/livros/novo-livro-de-alberto-manguel-conta-historia-da-curiosidade-guiado-por-dante-alighieri-20001556

3) A History of Reading – Alberto Manguel – Publicado em Penguim Books, 1997 – Nova York.


JAYME VITA ROSO

300_especial_2_3Graduado pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, é especialista em leis antitruste e consultor jurídico de fama internacional, ecologista reconhecido e premiado, “Professor Honorário” da Universidade Inca Garcilaso de La Vega de Lima, Peru e autor de vários livros jurídicos. Saiba mais.

vitaroso@vitaroso.com.br

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