O QUE O MEC NÃO “ENCHERGA” – PROF. ARNALDO NISKIER

 arnaldo

Membro da Academia Brasileira de Letras, Doutor em Educação e Presidente do CIEE/RJ

Saiba mais sobre o Prof.  Arnaldo Niskier

 

Acreditamos piamente que os examinadores do Enem, contratados pelo MEC para a correção das provas de língua portuguesa, saibam como são escritas  as palavras “enxergar”, “razoável” e trouxe”.  Se deram 1.000 pontos, para provas consideradas perfeitas, com os candidatos utilizando as formas “enchergar”, “rasoavel” e trousse”, como comprovou o jornal O Globo, é porque desprezaram a norma padrão ou culta, numa atitude francamente irresponsável.  São linguistas da Universidade de Brasília que orientaram esse comportamento, com o beneplácito do Inep.   

Parece que o Enem sofre com alguma caveira de burro que o acompanha desde os primeiros exames. Isso pode ser consequência da guerra surda travada entre linguistas (em geral jovens) e gramáticos, que se digladiam para interpretar, cada um a seu modo, a melhor maneira de promover a integridade do nosso vernáculo.                                   

O pior de tudo é que o aluno se torna a maior vítima desse lamentável processo. Os professores, em geral, seguem a orientação dos gramáticos e respeitam a norma padrão, expressa no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, editado pela Academia Brasileira de Letras. Vemos inovadores e topam tudo pela mudança, provocando o caos no ensino. Cabe ao MEC uma palavra ponderada de orientação, mas este abre mão dos seus poderes e se deixa levar, como uma folha de papel ao vento, correndo de um lado para o outro.

 A prova de que a correção é feita de modo superficial e rápido está no fato revelado de que um aluno inseriu, no meio da redação, uma explicação sobre como se prepara um miojo, e ficou por isso mesmo. Ou seja, passou direto, sem que o examinador tenha percebido. Irresponsabilidade?

 As explicações do Inep são risíveis diante de uma enxurrada de erros crassos de concordância verbal, acentuação e pontuação. Esses “desvios” não são considerados graves pelo MEC, o que nos leva a crer que está certo o professor que, diante desse descalabro, achou que se deveria dar à OAB a correção das redações. “Pelo menos eles fazem a coisa com seriedade”.

 O Guia do Participante do Enem, que foi alvo de muitas críticas, nos primeiros exames, prometeu um rigor extremo nas competências, mas não é o que ocorre na prática. A primeira das cinco competências é muito clara quando recomenda “demonstrar domínio da norma padrão da língua escrita.”Se, na hora da correção, isso se afrouxa, é claro que se está indo por um caminho condenável.

 Os que amam a língua portuguesa, sendo ou não especialistas, assistem a esse triste espetáculo e se perguntam se vale a pena lutar para que haja dois exames ao ano, como muitos pretendem. Estamos diante de uma questão de competência, pois recursos não faltam. Quem garante que a UnB está fazendo a seleção dos examinadores de forma isenta? De todo modo, o problema está posto e merece uma ampla discussão. Não se deve deixar os candidatos com esse tipo de perplexidade, sem saber o caminho a tomar. O adequado é a norma culta, e ponto final.

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