TUDO DEPENDE DO NETANYAHU – POR DAVID S. MORAN, DIRETO DE ISRAEL

351_Especial_5_1Está nas mãos do Netanyahu decidir, se ele continua se dizer perseguido e “enfrentar sua inocência” fora do tribunal, ou se dedica inteiramente para comprovar que é inocente, voltando como herói. Deixaria o seu posto, para que o país se tranquilize politicamente. O Estado de Israel não precisa de brigas internas, tem demais brigas e desafios que enfrenta. Nessas horas a responsabilidade tem que prevalecer e o caso nacional tomar o primeiro plano, deixando de lado o pessoal.


351_Especial_5_2Na segunda-feira (2), os israelenses correram às urnas, pela terceira vez em menos de 1 ano, para eleger o 23º Knesset. A campanha eleitoral foi muito feia e suja, com acusações mútuas dos principais concorrentes, os Benjamin, Netanyahu e Gantz. Neste dia, 6.453.255 eleitores tinham direito de escolher pela terceira vez em 11 meses, entre 29 partidos. Desta vez, por causa do Coronavírus, espalharam urnas especiais esterilizadas. Acreditava-se que muitas pessoas já estavam fartas de eleições e deixariam de cumprir o seu direito e obrigação cívica, mas para surpresa geral, a porcentagem foi maior (7%(1 comparado a 68.5% e 69.83% nas 2 anteriores.

Às 22h, todo o povo assistindo pela televisão aos resultados (não oficiais) dos censos de boca de urna, que davam uma reviravolta. O Likud ultrapassava o Kacho-Lavan, obtendo 36 a 37 deputados, contra 32 a 33. De um lado, via-se o Netanyahu vibrando ante o Gantz, com cara de luto. Não só pela diferença (charge do Amos Biderman, Há’aretz-02.3.20) na de deputados que elegeram, mas também pela parede estampada abril-setembro e março, bloco que eventualmente poderia formar novo Presidente Rivlin e os 2 rivais – Netanyahu e Gantz, governo liderado pelo Benjamin (Bibi) Netanyahu. Ele já se encarregou algumas vêzes de fazê-los assinar cartas de compromisso só com ele. O bloco que se auto denominou, “da direita” inclui o Likud,os religiosos nacionalistas do Partido Yemina (a Direita), mais os ultra ortodoxos do Shas e principalmente do Yahadut Hatora, que não são da direita. Seus filhos não se alistam no Exército e estão na coalizão por interesses do seu próprio setor.Juntos obtiveram-nos censos não oficiais- 60 deputados favoráveis.

Por outro lado, o Kachol-Lavan (KL) e sua coligação, chamada pelo Likud de “esquerda”, não é tão coesa. O KL é na realidade Centro e tem elementos da direita e da esquerda. Quem se disse a favor do Gantz na chefia da nação eram os que não queriam o Netanyahu, seja pelas acusações de corrupção, ou pelas acusações de racismo. O líder da LAU, deputado Aiman Ouda, disse em alegoria ao Purim – que será comemorado na próxima semana- “apoiamos o Gantz, não por gostar dele (Mordecai), mas pela raiva ao Netanyahu (Haman). O Netanyahu teve entre outros o slogan de que o Gantz só poderá formar coalizão com os árabes. No entanto eles têm direitos, podem votar e ser eleitos e disseram que só apoiarão um possível governo do Gantz por fora e não querem integrar nenhum governo israelense.

O eterno fiel da balança, nestas 3 últimas eleições, Avigdor Lieberman, do Israel Beiteinu, partido de direita, que Netanyahu acusa de ser da esquerda, por não lhe apoiar, avisou inúmeras vezes que não sentaria à mesa de governo, com apoio dos partidos árabes, que compõe a LAU.

Com o passar dos dias, a euforia do Netanyahu (“obtivemos tremenda vitória”) foi se dissipando, as informações foram variando. No começo das apurações, os coaligados sentiam-se perto do trono, com 60 deputados, bastando atrair 1 ou 2 deputados de outros partidos, para o seu lado. As informações corriam e deputados, que nunca ouviu seu nome, estavam sendo iscados. Na quarta (4) o quadro mudou, sairam os dados oficiais do TRE, que davam conta, o Likud é o maior partido, com 36 deputados, seguido pelo Kachol- Lavan, 33, a Lista Árabe Unida com 15, Shas- 9, Avodá/Guesher/Meretz-7, Yahadut Hatorá-7, Israel Beiteinu-7 e Yemina 6. Pelos blocos, a atual coalizão, também chamada direita tem 58 deputados, o bloco do centro-esquerda (inclui árabes) conta com 55 deputados e quem poderia decidir, é o Lieberman com 7. Só que este muda a fala a cada hora. “não sentarei com Primeiro Ministro que tem acusações criminais” e em seguida diz: não apoiará o KL se tiver apoio do Partido Árabe. Então vai apoiar a quem?

A situação como se nota é muito complicada. Netanyahu, que provavelmente terá que enfrentar a justiça em poucos dias, seu julgamento terá inicio no dia 17 de março. Escrevo provavelmente porque ele tenta evitar enfrentar os 3 juízes. Há partidos, como o KL, IB que querem trazer uma nova legislação, proibindo pessoa enfrentando a justiça de candidatar-se ao posto de 1º Ministro. Os deputados do Likud alegam que isto é perseguição pessoal, contra Netanyahu. Os pais fundadores do Estado não imaginaram isso possível e por isto não legislaram algo neste sentido. Qualquer ministro que é indiciado tem que se demitir, ou ser demitido e o absurdo é que o chefe do Estado não é obrigado a fazê-lo e nesta lacuna Netanyahu entra. Para muitos, o quanto mais ele se esforça para não enfrentar a justiça, mais suspeitas levanta. Nesta guerra, Netanyahu com deputados aliados confronta a polícia, o Procurador Geral do País, que são pessoas de sua confiança e que ele nomeou.

As acusações de perseguição não têm procedência. Os líderes da nação têm a obrigação de dar exemplo pessoal. Quando o ex-premier Ehud Olmert, estava sendo alvo de investigações criminais, até seus ex-amigos de partido (Olmert era do Likud e foi com Ariel Sharon e outros para o novo partido que fundaram, o Kadima), como o próprio Netanyahu, lhe pressionaram para que se demita. Na época (2008) o líder da oposição, Netanyahu, em entrevista à TV disse:”trata-se de primeiro ministro afundado até o pescoço em inquéritos. Não tem mandato público e moral de decidir coisas vitais para o Estado… há possibilidade que decidirá decisões do seu interesse pessoal e não do interesse nacional”.

351_Especial_5_3Tudo está nas mãos do Netanyahu. Os partidos opositores a ele declaram que não sentarão com ele num governo, por estar sob acusações esperando decisão da justiça. Esses mesmos partidos não descartam formar governo de unidade nacional, com o Likud, sem o Netanyahu. Este partido que já estava na lona, ressurgiu sob o carismático e bem falante Netanyahu. Ninguém no Likud se atreve a contrariá-lo. Só o popular deputado Gideon Sa’ar enfrentou-o em eleições internas e perdeu. Saar voltou a dizer que o Likud poderia formar novo governo de unidade nacional, se o Netanyahu saisse do caminho. O Presidente Rivlin, está receoso (ele nomeia os que têm chance de formar governo) e anteontem (4) disse: “não merecemos mais uma campanha violenta de eleições, que está se deteriorando até nojo”.

Parece que na política quem não joga deslealmente, perde. Mas há certos países, como os EUA e até mesmo o Brasil, que limitam o mandato para 2 termos, justamente para evitar o ditado “o poder corrompe”. O que não se fez em 2 termos, muito dificilmente se fará depois. Mesmo nesta campanha, Netanyahu prometeu trazer para Israel mais 7.000 judeus-etíopes, construir milhares de casas na Judeia e Samaria e outras promessas, que não foram cumpridas até agora, apesar dele já governar 14 anos ( Google homenageia as eleições em Israel).

Nestas condições, no momento em que escrevo, é muito difícil, talvez impossível formar um novo governo. Se não tiver outra alternativa, o país que está sem governo há mais de 1 ano, sem orçamento governamental, entrando em déficit, com inimigos em sua volta, não pode se dar ao luxo de enfrentar quartas eleições. A própria democracia israelense de que tanto nos orgulhamos, está em perigo.

Está nas mãos do Netanyahu decidir, se ele continua se dizer perseguido e “enfrentar sua inocência” fora do tribunal, ou se dedica inteiramente para comprovar que é inocente, voltando como herói. Deixaria o seu posto, para que o país se tranquilize politicamente. O Estado de Israel não precisa de brigas internas, tem demais brigas e desafios que enfrenta. Nessas horas a responsabilidade tem que prevalecer e o caso nacional tomar o primeiro plano, deixando de lado o pessoal.

QUEM SE SAIU BEM E QUEM SE DEU MAL NESTAS ELEIÇÕES.

Lista Árabe Unida. Antigamente, os cidadãos árabes de Israel votavam e tinham representação nos partidos gerais, Sionistas, no P. Comunista e em partidos árabes. Tinha inclusive partidos nacionalistas, por absurdo, atuando no Knesset contra a existência do Estado de Israel. Já em 1992, pelo multipartidarismo, que dificulta um regime parlamentarista de governar, foi aumentada a barreira de votos necessários, para um partido entrar no Knesset, de 1% para 1.5%. Quem obtem menos, todos os seus votos são perdidos. Em maio de 2004, o obstáculo foi para 2%. Em março de 2014, os atuais rivais, na época aliados, Netanyahu e Lieberman elaboraram a barreira de 3.25%, para tentar reduzir a representação dos árabes israelenses.

O inimaginável aconteceu. Os 4 partidos árabes rivais, que abrangem desde seculares, comunistas, religiosos muçulmanos e até nacionalistas anti israelenses, uniram forças e fundaram, a Lista Árabe Unida. Quanto mais eleitores iam as urnas, maior representação obtiveram. Jamais chegaram a ter 15 deputados e tem que agradecer este aumento a Netanyahu e Lieberman.

Likud. Com tanto antagonismo, o partido ficou unido em volta do líder e até outras agremiações como o Shas e Yemina, tiveram slogans pró Netanyahu. Após 2 derrotas feias para um partido novo (Kachol Lavan), nestas eleições obteve mais representação, mas pelo visto, não a formação de governo.

Há’avoda-guesher-meretz- esta coligação foi a grande perdedora. Há’avoda, do David Ben Gurion, dos fundadores do no Estado de Israel e que tinha poder absoluto durante 20 anos, foi com o tempo caindo e reduzindo a sua representação parlamentar e importância. A cada queda que sofre, seus líderes são criticados e deixam a política. Nestas eleições, juntaram-se 3 partidos e de 11 deputados antes, obteve dificilmente 7 nestas eleições.


DAVID S. MORAN – Mora em Israel, é formado em Relações Internacionais pela Universidade Hebraica de Jerusalém e Major da reserva do exército israelense.

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