CARTA A LEONARDO SAKAMOTO – POR LIONEL ZACLIS

Prezado Leonardo Sakamoto,

Assisto com assiduidade a suas participações no “Jornal da Cultura”. Permita-me parabenizá-lo pelos comentários sempre muito sérios e verdadeiros sobre o modo como o governo genocida de Israel vinha conduzindo (e, quem sabe, talvez venha a ser constrangido a ter que voltar a conduzir) a guerra, capitaneado pelo ditador Benjamin Netanyahu, a quem você, secundando certos democratas, apelidou de “o açougueiro de Gaza” (de modo muito merecido, aliás, ao contrário da alcunha que algumas pessoas malvadas e perversas haviam atribuído a outro democrata, o benevolente, piedoso e altruísta Yahya Sinwar, que hoje deve estar no paraíso com 72 húris).

Considero você um jornalista justo por ter condenado Netanyahu liminarmente, sem necessidade de provas e investigações sérias e válidas. Imagino que, por julgar-se uma pessoa abençoada pelos céus, dotado de carisma e midiática, deve considerar supérflua a necessidade de estudar a história e analisar a problemática do Oriente Médio com um mínimo de profundidade. Aprecio esse seu estilo “deixa que eu chuto”: basta-lhe tomar conhecimento de algumas notícias ou reportagens em algumas TVs ou assistir a alguns vídeos nas redes sociais, para ter certeza quanto à verdade das declarações feitas por instituições tão imparciais, como o Ministério da Saúde do Hamas, a ONU e, especialmente, a UNWRA (United Nations Relief and Works Agency for Palestine Refugees in the Near East), pouco se importando com o fato de esta última ter enfrentado recentes acusações sobre o envolvimento de funcionários seus nos ataques de 7 de outubro de 2023.

Bastam-lhe, também, os comentários imparciais da Sra. Francesca Albanese, ora excluída da relatoria especial da ONU em virtude de antissionismo e antissemitismo, isso para não falar do imaculado Karim Khan, Promotor do Tribunal Penal Internacional, que, visando a desviar a atenção mundial da acusação de assédio sexual feita por funcionária do próprio tribunal, disse que “nossa mente e foco coletivos devem estar nas vítimas de crimes internacionais” (será que estaria querendo dizer para que as mentes e os focos coletivos não deveriam se preocupar com as supostas vítimas dentro do próprio TPI?). Talvez por considerar essa treatralidade insuficiente para afastar as atenções do mundo, antes de ter sido suspenso de suas funções promotoriais, fez expedir mandado de prisão contra Netanyahu e Gallant, sob alegação de responsabilidade criminal por crimes de guerra e contra a humanidade. Não chegou, contudo, a enquadrar no crime de genocídio, talvez por achar que a vergonha pela qual estava passando já era demais da conta, de modo que convinha não passar por ignorante.

Bem por isso, você fez muito bem em acusar Netanyahu de ser um ditador sanguinário, qualidade que o coloca na mesma galeria de que fazem parte Kim Jong-un, Xi Jinping, Vladimir Putin, Bashar al-Assad, Ali Khamenei, Daniel Ortega, Nicolás Maduro. Realmente, todos sabemos que Israel não passa de uma ditadura constituída por judeus liderados pelo ditador Netanyahu, ancestrais dos quais planejaram e executaram o maior genocídio da história, torturando e assassinando mais de seis milhões de seres humanos na Segunda Guerra Mundial, numa grande preparação para que as Forças Armadas do futuro Estado de Israel estivessem preparadas para executar o genocídio do povo palestino. Fez bem, igualmente, em negar que essas Forças Armadas estejam defendendo os israelenses numa guerra de sobrevivência nacional, pois, na verdade, o que fazem é apenas cometer esse genocídio e prolongar a guerra, com o propósito exclusivo de evitar que o comandante-mor Netanyahu seja condenado sob acusação de corrupção, por ter sido agraciado com algumas caixas de charuto e algumas garrafas de champanhe.

Aliás, falando nisso, você “matou a cobra e mostrou o pau”, ao sustentar que o plano urdido por Netanyahu era o de esticar a guerra até que, com a idade de um Matusalém, se livrasse da cadeia. Só mesmo pessoas clarividentes, dotadas de mente brilhante e de intuição perfeita, absolutamente imunes a erros, é que conseguem penetrar no pensamento alheio, como você e as fontes nas quais se abebera. Sem dúvida, por que não dar o ditador por condenado, antes mesmo de ser julgado? De fato, para que julgamento, não é verdade? Isso é perfumaria de pequenos burgueses, que insistem em defender a democracia, os valores judaico-cristãos, a Constituição e as leis, porém ignoram o que de fato seja a democracia, que, como bem sabemos nós, é o poder de fazermos tudo o que nos agrada e de impedir que nossos adversários, os “anti-democratas”, tenham o mesmo poder, certo ?

Já nós não, não é mesmo, prezado Sakamoto ? Nós não nos deixamos cair nessa armadilha. Para nós, basta bater o olho e obter algumas informações de fontes imparciais e imediatamente descobrimos se a pessoa é culpada ou inocente. Por isso conseguimos concluir com toda facilidade, indo ao limite na nossa linha de raciocínio, que os cidadãos que votaram nos membros do governo israelense são, no mínimo, antidemocratas, fascistas, nazistas. A essa mesma conclusão, aliás, podemos chegar a partir das premissas, todas verdadeiras, firmadas por um dos mais circunspectos, assertivos e abalizados líderes desta república, a figura mais honesta “deste paiz”, verdadeiro espírito de escol, mesmo porque, de acordo com a lógica do raciocínio, só mesmo fascistas e nazistas para eleger nazistas, fascistas, genocidas Por conseguinte, às favas com a presunção de inocência, com a dignidade da pessoa humana, com os princípios da legalidade, do contraditório e da ampla defesa. Nós, aquinhoados com o dom da superioridade moral, não caímos nessa, certo? Isto porque, acima de tudo, temos sempre a mais absoluta certeza dos julgamentos que fazemos e em relação aos quais jamais erramos.

Por tudo isso, continue sempre assim. Estou totalmente fechado com você nesta de não ter que se aprofundar na procura da verdade, já que isso representa pura perda de tempo, meras “peripécias”, como se expressava o Dr. Casemiro, famoso personagem médico do saudoso Jô Soares. Quanto à “ciência social”, então, não passa de velharia escondida nas páginas de Auguste Comte, Émile Durkheim, Max Weber, Harriet Martineau, cujos ensinamentos só servem para florear teses e dissertações acadêmicas, certo? Fazemos, pois, muito bem em jogá-los às traças, pois de ciência nada têm, até porque, nestes tempos de pós-verdade, o que vale mesmo são os preconceitos, as mentiras, as fake news espalhadas pelo mundo. Isto, na verdade, é o que atrai a atenção das massas. O resto não passa de frufru de gente com cujos valores nós, donos da verdade (que conseguimos captar por mera intuição), não comungamos, certo?

É por tudo isso que tomo a liberdade de te parabenizar!

Atenciosamente,


Lionel Zaclis

Formado pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo e atuando nas áreas de Contencioso, Contratos, Direito Econômico e Empresarial, Lionel Zaclis é Especialista em Direito Processual Civil pela PUC/SP, Mestre e Doutor em Direito Processual pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.