COMO A NÓS MESMOS? – RABINO RUBEN STERNSCHEIN

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É possível amar coisas diferentes do mesmo modo? Dois filhos diferentes, dois pais, duas músicas, dois pratos, duas viagens, duas atividades? E quando uma é muito mais próxima, íntima, própria?


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E possível amar coisas diferentes do mesmo modo? Dois filhos diferentes, dois pais, duas músicas, dois pratos, duas viagens, duas atividades?

E quando uma é muito mais próxima, íntima, própria? Não se dificulta ainda mais a possibilidade da simetria? Qual o sentido, então, do mandamento de amar o próximo como a nós mesmos que aparece na parashá da semana? Qual a aplicação possível?

Hillel sugeriu que se trata de usar nós mesmos como parâmetro para os outros: não fazer com os outros o que não gostamos que seja feito conosco. Poderíamos ampliar o conceito e dizer: a ideia é reconhecer no outro alguém semelhante a nós, com medos, aspirações, desejos, capacidades, fraquezas, erros e acertos. Assim como cuidamos de nossos interesses, cuidar dos dos outros, assim como perdoamos nossos erros, perdoar os dos outros, e exigir dos outros apenas o que exigimos de nós mesmos. Neste exercício, algumas pessoas descobrirão que a dificuldade está no amor a si próprio, pois elas perdoam mais facilmente os outros que a si próprios, e exigem mais de si do que dos outros.

A tentativa de estabelecer uma simetria com os outros pode ajudar a trazer o melhor standard em ambas as direções: se somos mais compassivos e condescendentes conosco, então devemos aplicar esse padrão também aos outros e perdoá-los mais. Se formos mais exigentes com os outros, aplicar esse critério conosco e nos exigirmos mais.

Todavia, existe um problema: o outro é outro. Como aplicar a ele nossos gostos e parâmetros? Seria como comprar para outra pessoa o presente que gostaríamos de receber ao invés do presente que ela gostaria de receber. Amar o próximo como a nós mesmos é um esforço ainda maior que aplicar nosso standard a eles, é entender e incorporar o standard dele. No mínimo para ele, na hora de avaliar, valorizar, ouvir, apreciar, receber. Amar segundo o que ele entende o que é amor.

Além disso, habitar a intimidade do outro, sentir como ele sente, pensar como ele pensa, pode nos ajudar a enxergar a nós mesmos com mais objetividade e também com mais amor. Descobrir o que o outro gosta em nós pode nos ajudar a gostar mais de nós mesmos, como também entender melhor o que ele não gosta e não conseguimos ver com nossos próprios olhos.

Ainda existe mais uma dificuldade: o outro é totalmente outro. Como sentir o que ele sente, pensar o que ele pensa, e enxergar através de seus olhos? Sempre que dizemos “no lugar do outro, eu faria…”, devemos saber que nunca estamos realmente no lugar do outro porque sempre seremos nós, com a nossa história e repertório, não ele, nesse lugar.

O mandamento de amar o próximo como a nós mesmos termina com as palavras “Eu sou Deus”. Talvez o fundo desta frase seja um desafio existencial: viver tentando nos aproximar do outro como de Deus, isto é, sabendo que nunca o alcançaremos totalmente e, mesmo assim, sem renunciar. E sabendo que nessa tentativa também fazemos o caminho infinito a nós mesmos.

Shalom..


RABINO RUBEN STERNSCHEIN – Rabino da Congregação Israelita Paulista desde janeiro de 2008, Saiba mais.

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