SIMONE KESTELMAN EXPÕE SUAS OBRAS EM NOVA YORK

307_fique_1_1“Na pesquisa artística que vem desenvolvendo, Simone transforma a matéria em esculturas e objetos artísticos, para tratar da vulnerabilidade social e cultural da mulher desde menina, ampliando os horizontes do ativismo artístico”.


 

307_fique_1_2

Se você estiver em Nova York, não pode perder a oportunidade de apreciar as obras de Simone Kestelman, artista carioca radicada nos Estados Unidos, na exposição que está fazendo o maior sucesso.

No ano passado elas estiveram na Grécia no Thessaloniki Contemporary Museum e agora podem ser vistas na mostra “Violated Bodies: New Language for Justice and Humanity”, em exibição no Suny Old Westbury College, em Long Island, até o dia 15 de Março.

307_fique_1_3E entre os dias 28 de Fevereiro a 13 de Abril, no John Jay College em Manhattan. A curadoria é de Deborah Saleeby-Mulligan e Kyunghee Pyun.


A obra de Simone Kestelman

“Não se nasce mulher, torna-se mulher”, esta frase sintetiza o argumento central de Simone de Beauvoir, no livro O Segundo Sexo, que publicado no final dos anos 40 viria a ser conhecido como um marcador fundamental do pensamento feminista e um inspirador das reflexões e teorizações a respeito das desigualdades construídas em torno das diferenças de sexo.

Com muita sensibilidade e precisão, Simone Kestelman faz um convite irrecusável para refletirmos sobre a violência embutida no processo de tornar-se menina.

A violência contra a criança é, certamente, um dos atos que maior repulsa causa no mundo contemporâneo. As obras da artista são especialmente interessantes porque, ao evocar os casos extremos de violência como os campos de concentração, o trabalho infantil, a fome e a subnutrição, aguçam, também, nossa perplexidade para a brutalidade de atos mais sutis, tidos como lógicos e naturais no desenvolvimento humano.

307_fique_1_4

Em cantigas, por exemplo, as cantigas de roda se combinam em dose certa com esculturas de vestidos de meninas ocos e suspensos. O terror que os vestidos eventualmente poderiam acarretar é minimizado pela atração da beleza plástica das peças cuidadosamente elaboradas e compostas. .A ingenuidade das cantigas de roda da infância ganha, no entanto, uma conotação inusitada quando atentamos para o sentido das palavras que compõem as canções e que revelam o quanto de terror e submissão feminina estão nelas embutidos.

Discreto, porém intenso o trabalho de Simone Kestelman inova também porque incorpora na sua produção olhares de públicos diversos. É parte das instalações relatos e comentários que colados na parede trazem novas dimensões para uma obra que parece recusar um ponto final e, ao mesmo tempo, abrir espaço para a possibilidade bem-vinda de incorporação de desenvolvimentos constantes e alargados pelos olhares do público que é interprete e não apenas espectador. Em Maravilhas, reproduções em vidro de monumentos arquitetônicos nacionais, 190 crianças surdas e cegas puderam ter acesso ás obras por meio do toque da audiodescrição e da língua de sinais.

Na pesquisa artística que vem desenvolvendo, Simone transforma a matéria em esculturas e objetos artísticos, para tratar da vulnerabilidade social e cultural da mulher desde menina, ampliando os horizontes do ativismo artístico.

Sua produção ecoa peremptoriamente a ideia de que não se nasce meninas ou meninos, mas está aí envolvido um longo processo de produção de diferenças por meio do qual marcas físicas sutis se transformam num divisor central na produção de classificações, hierarquias e formas de submissão de seres humanos.

Guita Debert
Antropologa

Sublime

“Cantigas” transforma a força adversa da violência na força favorável da vontade política que, afinal, é um dos poderes da arte contemporânea.

Os vestidos ocos de cerâmica evocam meninas invisíveis. Diante deles, percebe-se a coisa. Uma coisa enquanto um objeto do qual se pode apropriar, destituída de si mesma. Uma coisa não tem vontade própria. Uma coisa não decide. Uma coisa enfeita. Uma coisa se negocia. Uma coisa pode ser encaixotada. Uma coisa pode ser usada. Uma coisa pode ser manipulada. Uma coisa não deseja e não sente. Nem pensa e nem fala. O que justifica o aparente impasse da beleza plástica desse trabalho artístico sobre violência é que é a mesma beleza permitida às coisas.

O oco dos vestidos, que evoca a coisificação, é o mesmo que nos permite preenchê-lo com a consciência sobre a dor que sente a vida conformada em coisa. A dor de não-ser existe. E, se é possível superá-la, é porque também podemos Ser.

Fernanda Carlos Borges

https://glorinhacohen.com.br/?p=10702 (parte da exposição “Cantigas” pode ser vista aqui)


Sobre a artista

307_fique_1_5Simone Kestelman, atualmente residindo nos Estados Unidos, é uma artista nascida no Rio de Janeiro. Iniciou a sua carreira como designer, desenvolvendo técnicas criativas e expressivas de pintura em cerâmica e em vidro, aplicadas em obras de design. A partir de 2009, decidiu combinar todo seu know how para a criação artística. Em 2011, deu acesso à 190 crianças surdas e cegas a reproduções em vidro de monumentos arquitetônicos e naturais do país que podiam ser tocadas, na exposição As Maravilhas Brasileiras, na Casa Cor. Também em 2011 apresentou a série de esculturas de vidro Caminhos, nas quais expressa suas emoções diante das inúmeras estradas que percorreu em viagens, no Corning Museum of Glass, em Nova York. Em abril de 2012, a coleção Caminhos foi exposta na Galeria de Arte A Hebraica, em São Paulo.

A habilidade na escultura, a paixão pelas crianças, o contato com a diversidade cultural e a conscientização de sua própria condição enquanto mulher despertou em Simone a razão e a maturidade artística que vem conduzindo seu trabalho desde então: o uso artístico de roupas e acessórios, transformados em esculturas e objetos artísticos, como meio para evocar a vulnerabilidade social e cultural da mulher, desde meninas. Em fevereiro de 2013, o trabalho Undesired-Indesejadas recebeu a Medalha de Outro como melhor instalação contemporânea na ArtsLand, tratando do descarte de meninas na Índia e na China. Em 2013, foi a artista escolhida pela WCA International Caucus, afiliada a ONU, que reúne exemplos de projetos de arte e ativismo.


307_fique_1_6

20
20