NÃO PERGUNTE QUE EU RESPONDO – ILDO MEYER
Qual o problema do parceiro não saber uma resposta ou não querer responder naquele momento? Isso não faz dele um insensível, pelo contrário.
Pessoas sensíveis sabem que existem coisas que melhor se dizem calando.
Nascemos.
E a partir deste momento mágico, inicia nosso treinamento para questionar e responder.
Pais e avós orgulham-se da inteligência de seus bebês quando estes, questionados, apontam rapidamente, sem hesitação, o narizinho e a orelhinha. Mais tarde vem a escola ensinando respostas mais difíceis: “Qual a capital da França?”, “Por que a lei da gravidade faz a maçã cair?”. E, mesmo quando adultos, nosso conhecimento continua sendo testado em provas para faculdades e concursos.
Assim, lenta e gradativamente, somos induzidos a acreditar que a vida acontece e se explica através de perguntas e que sempre existirá uma resposta correta. Dependendo de nosso desempenho, receberemos um conceito e seremos aprovados ou não.
Mas a vida é bem mais que isso. Algumas perguntas terão resposta. Outras vão produzir mais de uma resposta, e todas estarão corretas. E talvez algumas perguntas sejam irrespondíveis. É preciso saber conviver com esta complexidade. E é justamente aí que algumas pessoas se complicam.
São as chamadas “pessoas mecânicas”. Seus raciocínios funcionam de maneira linear e horizontal. Precisam de respostas claras e objetivas, pois acreditam que tudo envolve uma explicação lógica. Suas vidas funcionam em uma relação de causa-efeito, inclusive seus sentimentos, que necessitam argumentos coerentes para sobreviver.
Pessoas mecânicas escutam aquilo que lhes interessa, perseguindo um gabarito utópico. Dão notas a seus pares e permanecem sempre em estado de alerta, examinando e elaborando novas questões, que necessitarão de um novo gabarito. Uma sucessão de altos e baixos, formando uma gangorra existencial que não oferece paz nunca.
O rapaz adiciona a nova secretária como amiga no facebook. A namorada observa a foto, acha a secretária bonita e questiona o motivo de tal atitude. Talvez o pobre rapaz simplesmente tenha aceitado um pedido de amizade, recebeu um comentário, levou uma cutucada. Como explicar? Para que explicar?
Pessoas mecânicas nutrem-se com respostas, explicações, justificativas, provas que amenizem sua insegurança. Precisam estar com alguém que se submeta a seus interrogatórios e lhes alimente permanentemente. Alguns relacionamentos funcionam nestas bases. Funcionam?
Analisando rapidamente parece que sim, porém o sentimento nunca consegue amadurecer, pois está sendo checado e colocado à prova a todo instante. É mais ou menos como assistir a um truque de mágica e ao invés de se encantar com a beleza do coelho saindo por dentro da cartola, ficar quebrando a cabeça tentando descobrir a trapaça que o mágico realizou. O show perde toda sua graça.
Dúvida e desconfiança são sentimentos que não conversam. Suspeitam, interrogam, espionam, acusam e dificilmente dão chance a qualquer tipo de diálogo ou troca. Esta convivência inquisitória transforma a relação em tribunal, onde o suposto juiz, ao julgar o outro, não têm condições para amá-lo.
Qual o problema do parceiro não saber uma resposta ou não querer responder naquele momento? Isso não faz dele um insensível, pelo contrário. Pessoas sensíveis sabem que existem coisas que melhor se dizem calando. Talvez o silêncio seja um sinal de respeito pelo sentimento que um ainda nutre pelo outro.
Todos temos nossa herança “mecânica”, entretanto, alguns escolhem saltar fora da engrenagem e arrebatar suas vidas. Se entregam, acolhem, acreditam, confiam, têm fé e acima de tudo, amam. Não precisam de palavras, explicações ou perguntas. Sabem que o silêncio pode expressar sentimentos que palavras nunca vão conseguir traduzir. Um único olhar pode deixar tudo muito claro. Não precisam de tribunal. Eles sentem….Eles vivem…”
ILDO MEYER – Médico formado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Saiba mais.