A CABALÁH DE CONSERTAR-SE – RABINO RUBEN NAJMANOVICH
Devemos renovar-nos sinceramente, trocar decididamente nossos atos e intensificar nosso amor por D’us. Consertar-nos. Porque o amor a D’us se manifesta pelo amor ao Ser Humano.
Nossos sábios nos contam no Talmud a história assombrosa de um “águia perene” que cada mil anos voa direto em direção ao sol. As penas desta ave se queimam, seu corpo cai a terra, e ali ocorre o processo de regeneração de suas asas. O conto é totalmente insólito. Em realidade, cabe a pergunta: se a águia vai viver para sempre, para que consertar suas asas a cada milênio?
O qual é o problema de viver sempre com o mesmo par de asas?
Um sábio respondeu acertadamente: “Para ensinar-nos que cada um de nós, os seres humanos, devemos aprender a renovar-nos”. A águia, fiel exemplo dele, sabe como fazê-lo e nos serve de modelo. Quando chega o momento da renovação, a águia não duvida e só se eleva em direção aos céus, em direção à sua raiz nos lugares altos. Fazendo a comparação com os seres humanos podemos afirmar: a chave principal para a renovação pessoal é adquirir a habilidade de fortalecer nossa conexão com a raiz, com a fonte, com D’us.
Podemos às vezes sentir-nos desconectados das raízes e de nosso verdadeiro eu. Mas D’us é infinito e sempre possibilita um novo desafio. Ele renova o universo diariamente com Sua Infinita Bondade. Se for assim, devemos elevar-nos e conectar-nos com essa “fonte de energia” para conseguir a tão ansiada renovação, e assim, regenerar-nos satisfatoriamente.
Contam que um dia de inverno, um velho lenhador foi ao bosque junto com seu filho em busca de lenha. O lenhador buscou uma árvore morta e o cortou. Várias semanas depois, ao chegar à primavera, viu com luto que o tronco flácido dessa árvore que ele havia talhado lhe haviam brotado “abrolhos”. Lamentando-se, o pai comentou o seguinte: “Estava seguro que essa árvore estava morta. Havia perdido todas as folhas na época de inverno. Mas se vê que fazia tanto frio que os galhos se quebravam e caiam como se não lhe ficasse ao pobre tronco nem um bocado de vida. Mas agora, vejo com claridade, que ainda alentava a vida dentro daquele tronco”.
E voltando-se em direção a seu filho, lhe aconselhou: “Nunca esqueças esta importantíssima lição. Jamais cortes uma árvore em época de inverno. De nenhum modo tomes uma decisão negativa em tempo adverso. Nunca tomes decisões importantes quando estejas em teu pior estado de ânimo. Aguarda. Sê paciente. A tempestade rápida passará. Recorda que sempre a primavera voltará”.
D’us plasma sua Divindade ao nosso redor e se manifesta constantemente no mundo terreno. Podemos encontrar exemplos de renovação quase em todas partes. As estações do ano vão e vem, assim como as marés. As flores brotam, florescem e morrem… e voltam a brotar. Se bem que o Criador Todo poderoso pudesse haver criado com absoluta facilidade um mundo que sempre se mantenha igual, de qualquer maneira, optou por criar um mundo que expressa uma constante “renovação”. Em nossas escrituras se indica que o conceito do tempo está construído em base ao dia de Shabat. Durante os primeiros seis dias da semana o mundo se move, vibra uma e outra vez; e no dia de Shabat nos detemos com uma só intenção: a de renovar-nos.
Voltando ao parágrafo que incluímos diariamente em nossas rezas: “D’us renova com sua Infinita Bondade Sua criação cada dia”. Não esqueçamos que cada um de nós, assim de pequeninos como somos, formamos um minúsculo microcosmo dentro da criação. D’us faz que cada dia seja “um novo dia” para que nós também possamos renovar-nos.
Renovação e mudança… e consertar-se.
Não sejamos obsessivos respeito a nossos atos e subseqüentemente, ver somente o negativo. Pensemos no amor que D’us sente por nós, imaginemo-lo a Ele como a um Pai carinhoso. Não esqueçamos a possibilidade de definir o passado. Estas possibilidades nos deveriam dar força e coragem para sobressair qualquer sentimento de desânimo.
Devemos renovar-nos sinceramente, trocar decididamente nossos atos e intensificar nosso amor por D’us. Consertar-nos. Porque o amor a D’us se manifesta pelo amor ao Ser Humano. E nós como Iehudim (judeus) que temos uma história cheia de valores humanos, devemos, mas que nunca, praticar esse amor, e mais, fortalecer-nos espiritualmente e intelectualmente, alinhados em favor de um só objetivo, o crescimento.
E ainda que o passado seja “pesado” e nos dificulte trocá-lo pelo presente, devemos considerar-nos como uma criança recém nascida; e desde esta perspectiva (recordo que também foi a minha), juntar forças e ser capazes de começar mais uma vez.
Querido irmão Iehudí: Apesar de que, às vezes, as circunstâncias ao nosso ao redor sejam tristes, a parte nossa que está conectada com o Divino se mantém pura e tem o poder de fortalecer o resto.
Queira D’us que possamos reconhecer nossa ligação com o infinito e sempre tenhamos, igual a águia, a possibilidade de regressar renovados ao nosso verdadeiro ser. A consertar-nos, para poder desapegar e, como a águia, voar e seguir vivendo como a árvore no inverno.
RUBEN NAJMANOVICH – Rabino, Professor da Ciência da Religião, Mestre em Ciências Sociais e humanidades menção educação. Saiba mais.