INFORMAÇÕES ATUALIZADAS SOBRE A SOCIEDADE ISRAELENSE – POR SHEILA MANN

 sheila

Trago hoje pra vocês um estudo completo sobre a sociedade israelense, escrito por um amigo meu israelense de origem brasileira, o Davi Windholz, ativista pela paz entre israelenses e palestinos através da sua ONG, a Alternative. Nesse estudo, ele mostra a complexidade dessa sociedade e nos deixa com a impressão de que qualquer esforço em prol da paz é extremamente complicado. Enfrentando BDS, recrudescimento de manifestações racistas e antissemitas, como nós judeus da Diáspora somos supostos reagir tendo em mente todos esses dados relacionados abaixo?


 • Israel tem 22000 km2. Menor que Sergipe, do tamanho da Lagoa dos Patos. Palestina (Cisjordânia e Gaza) tem 8000 km2.

• A população de Israel é de 8 milhões 345 mil habitantes. 75% judeus, 17% muçulmanos, 4.3% sem definição de religião, 1.9% árabes cristãos, 1.8% drusos. 69% israelenses, 21.6% nascidos na Europa-America, 9.6% na Ásia-África.

• 300.000 estudantes, 9 universidades, 95% de alfabetizados

• 200.000 estrangeiros, que não estão inclusos nos dados anteriores.

• Entre os judeus – 43% não religiosos, 23% tradicionalistas, 25% religiosos sionistas, 9% ultra-ortodoxos (não sionistas).

• 1.2 milhões vivem em Tel Aviv e 1.8 em volta de TA, 800 mil em Jerusalém, 800 mil em Haifa e 3 milhões na periferia (Galil e Neguev).

• Existem 4 sistemas educacionais: estadual judaico laico, estadual judaico religioso, estadual árabe e particular, ultra-ortodoxo (ashkenazi e sfaradi). Existem algumas escolas/redes particulares com apoio de verbas do ministério da educação.

• Nas escolas judaicas se estuda em hebraico, nas escolas árabes se estuda em árabe, nas escolas ultra-ortodoxas se estuda em idish.

• Nas escolas árabes estudam muçulmanos, drusos e cristãos. Os cristãos tem uma rede particular (Notre Dame e Terra Nuestra), nas quais só cristãos estudam nela.

• Não tem judeu estudando nas escolas árabes, mas tem árabes estudando nas escolas judaicas.

• Existem 170 centros comunitários (com 700 sedes) em todas as cidades do Pais, inclusive em todas as aldeias árabes. Os centros comunitários são responsáveis por toda a educação e cultura local. Cada centro tem uma direção de representantes locais, que decidem os conteúdos e verbas do mesmo. Os centros são unificados debaixo de uma Organização que recebe verba dos ministérios de educação, saúde, esporte, serviços sociais e outros de acordo com os projetos. A Sochnut Hayehudit , através de doações das comunidades judaicas, constroem os centros comunitários com co-parceria governamental. A Joint patrocina programas de cunho social.

• Existem cidades mistas e cidades e aldeias só de árabes ou só de judeus. Fora de Neve Ilan não existe aldeia mista de árabes e judeus. Meilia e Fassuta são aldeias cristãs que proíbem a venda de terras ou casas a judeus, muçulmanos ou drusos. Aldeias comunitárias judias fazem o impossível para que árabes não comprem casas. Rabinos de Safed, Maalot e outras cidades com população judia (mas também com população árabe) prescreveram “pssak halacha” proibindo a venda de terras e casas a árabes. Sachnim, Um El Fachem e outras cidades árabes (praticamente com toda população muçulmana) proíbem a venda de casas a judeus.

• Os judeus de toda a região da Galileia vão fazer suas compras em Yarcha (aldeia drusa), Dabach (rede de super em aldeias árabes). Os árabes vão fazer suas compras e passear nos centros de compras (shopping centers) nas cidades judias.

• Em Ramadan as cidades de Naharia (judia), Akko (mista), Haifa (mista), Tel Aviv e Jerusalém lotam de visitantes muçulmanos da Galileia e do Neguev, com livre acesso a todos os lugares.

• Em Natal- Chanuka, Haifa festeja a Festa das festas com visitas de mais de 150 mil pessoas por dia.

• Os hospitais do norte tem em sua maioria médicos/as e enfermeiras/os árabes e russos(judeus). Os quartos nos hospitais são para 3-4 pessoas. Num mesmo quarto você encontra judeus (de todos os tipos e cores) e árabes (de todos os tipos e cores). Semana passada uma judia recusou-se a entrar num quarto no qual tinha uma árabe , o medico (árabe) disse a ela a procurar outro hospital.

• Todos tem os mesmos direitos trabalhistas, mas homens ganham mais que mulheres e judeus mais que árabes. Se fizerem uma pesquisa certamente encontrarão que laicos ganham mais que ultra-ortodoxos.

• Mais de 60% das musicas tocadas na radio são orientais (mizrachi-sfaradi). A comida típica em Israel é a comida mizrachi (sfaradi) enquanto que no exterior quando se fala em comida judaica (idishe) se fala em kneidalech, krepalech, etc.E mesmo assim a sensação é que os ashkenazim dominam a cultura israeli.

• O partido Shas (sfaradi) foi criado pelo Rav Shach (ashkenazi) para contraposicionar o partido ultra-ortodoxo ashkenazi. Alunos ultra-ortodoxos sfaradim são recusados em escolas ultra-ortodoxas ashkenazim (apesar de ser proibido por lei).

• Os sfaradim segregam qualquer sinal cultural ashkenazi, os ashkenazim aos sfaradim. Os sfaradim chamam as russas de “putas”, que por sua vez chamam os sfaradim de “primitivos”. Parte da população judia segrega o árabe, parte da população árabe segrega os judeus. TODOS segregam os etíopes e negros. Os marroquinos se pegam contra os tripolitaim, os yekes contra os poloneses. Os árabes cristãos se acham elite cultural e segregam os muçulmanos (em primeiro lugar), e os drusos (em segundo lugar). Os drusos odeiam aos turcos (estes perseguiram e massacraram comunidades drusas) e entre 4 paredes falarão mal dos muçulmanos.

• De novo – judeus ashkenazim, sfaradim, russos, etíopes e árabes cristãos, drusos, muçulmanos tem livre acesso a qualquer parte de Israel.

• Apesar de viverem um ao lado do outro na Galileia (o que separa é uma estrada ou rua) um judeu de Kfar Vradim não vai brincar com um árabe de Tarshicha (e vice-versa). As duas crianças vão se encontrar no super, no Shopping , restaurante, hospital, cinema – aonde for. Só não na escola.

• Os drusos fazem exercito e convivem com a sociedade israelí, mas nunca aceitarão que um membro de sua comunidade case com um judeu.

• Mais de 50% da população judia não saberia se ela é sfaradi ou ashkenazi, pois vem de casamento misto (ashk-sfar), se não fosse a definição por parte do pai (meu neto é ashkenazi, apesar de minha nora ser sfaradia).

• Não existe nenhum lugar que por lei seja proibido a entrada de judeus ou árabes, brancos ou negros, ashkenazim ou sfaradim. Mesmo assim, em discotecas se faz “seleccia”(seleção na entrada – sfaradim, etiopes, árabes, etc.).

• A maioria dos sefaradim vota pela direita. A maioria absoluta dos religiosos vota pela direita. Os ashkenazim estão divididos (anos atrás a maioria votava pelo centro-esquerda, talvez ainda hoje). Tel Aviv vota em massa pela esquerda, a periferia vota em massa pela direita. Os árabes votam em massa pelos partidos árabes. Os ultra-ortodoxos votam em massa pelos partidos ultra-ortodoxos (ashkenazi e sefaradi ).

• As elites esquerdistas vêem aos que votam na direita “massas incultas” (que quando ditas por intelectuais de esquerda me lembram os termos usados em relação as elites brasileiras em relação aos que votam ao PT). As elites econômicas votam pela esquerda, as camadas populares votam pela direita (inversão dos fatores).

• Enquanto que em Israel são festejadas as paradas gays nas comunidades judaicas liberais, nas comunidades árabes e judias religiosas eles são totalmente segregados, até espancamento e morte.

• Apesar de proibido o brit(circuncisão) em mulheres, os beduínos praticam isso ate os dias de hoje em Israel, e o Estado não tem como reagir.

• Existem mais de 10 organizações de artistas árabes independentes, com livre direito a expressão.

• 11% dos estudantes de BA são árabes e estudam em todas as universidades de Israel, inclusive Bar-Ilan, que é uma universidade religiosa (religiosos sionistas). Ainda assim é pouco, pois os árabes são 20 % da população. Isso se deve ao nível do ensino das escolas árabes e as condições econômicas.

• O jovem árabe em Israel esta muito mais preocupado com seu futuro pessoal do que com a questão palestina. No meu centro estamos criando um processo para ativar os pais em prol de um maior envolvimento e compromisso com os problemas do palestino em Israel e na Palestina.

• No sistema educacional o professor é proibido de falar e posicionar-se em política. O sistema educacional estatal religioso (indiretamente ligado a partidos religiosos sionista) através das dissertações bíblicas fala em política, assim como os ultra-ortodoxos (indiretamente ligados aos partidos ultra-ortodoxos Agudat Israel e Shas). O sistema estatal árabe (indiretamente ligado aos partidos árabes) ao estudar o Coran, historia árabe falam em política. Os únicos que não falam em política são os judeus que seus filhos estudam no sistema estatal laico(sem nenhuma filiação direta ou indireta a partidos políticos).

• Entre as 20 famílias mais ricas do pais, 10 são sfaradim e 10 são ashkenazim. Essas famílias controlam 34% das entradas das 500 maiores firmas de Israel. Ofer e Tshuva (sfaradim) são as duas maiores riquezas no Pais.

• Entre os 10 maiores cantores (vendas e entradas) , 8 são sfaradim e só 2 ashkenazim (Shlomo Artzi em 8º lugar e Idan Reichel em 10º).

• A deputada Miri Reguev , atual ministra da cultura e do esporte é um exemplo a mais da divisão ideológica cultural do Pais. Ela fez declarações que não patrocinará teatro anti-sionista (desde o seu ponto de vista de sionismo – ou seja ame Israel de qualquer forma e não critique). Os artistas que veem a Israel como democracia e depois judaica protestaram (em sua maioria ashkenazim). Por outro lado,artistas que vem Israel antes judaica e depois democrática (em sua maioria sfaradim) apoiaram a ela. Esta diferença de visão de mundo é crucial para o futuro de Israel (democracia judaica ou Estado judeu, podendo ser democrático ou não).

• O presidente Rivlin (a favor de um estado entre o rio Jordão e o mediterrâneo), revisionista, retirou ontem a bandeira da Casa Presidencial, dizendo que isso deveria ser feito em todas as instituições publicas, pois as minorias não judias não podem identificar-se com ela, pois o símbolo central é a Maguen David( estrela de Davi). Convidou a artistas a desenharem uma nova bandeira que todos os cidadãos de Israel possam identificar-se. O próximo passo será pedir para mudar o Hino Nacional.

• A ex-ministra de educação em seu turno há 5 anos atrás exigiu que em todos as escolas publicas fossem hasteadas pela manhã a bandeira nacional e o Hino.

• Hoje o vice-ministro de educação, disse a parlamentar Zoabi, que nos (judeus) fazemos um favor que vocês (árabes) estejam na Knesset.

• O ministro da Educação , Benet, representante do partido de extrema direita, replicou dizendo, que ninguém faz favor a ninguém e que todos tem os mesmo direitos, judeus e não judeus.

• 100% da população sonha em morar no exterior, mas 80% da população está muito contente no pais, e não mudaria de lugar.

• E o pior, isto é , o mais louco, 100% da população árabe- palestina em Israel querem um Estado palestino, mas a maioria absoluta NUNCA iria morar no Estado Palestino, no dia que este for criado.

“Então, o que somos em que parte somos racistas, segregacionistas, e praticamos apartheid, etc. Nenhum desses termos se adapta a Israel. Nem a mente humana e nem Deus ainda conseguiram criar um vocabulário para definir  Israel e o que acontece por aqui”. Davi Windholz.


 SHEILA MANN
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Sheila Mann é judia, formada em artes plásticas, nascida no Líbano e crescida em Israel. Ela é conhecedora das culturas árabe e judaica com fluência em ambas as línguas, o que a torna ainda mais próxima das duas comunidades. A artista chegou ao Brasil, com 18 anos, casada e grávida de gêmeas. A dura fase de adaptação a nova cultura e aos filhos logo foi superada com a decisão de voltar a estudar. Inscreveu-se no curso de literatura da Aliança Francesa, para não perder a fluência no idioma adquirido em sua escola primária no Líbano, e também resolveu estudar artes plásticas.
Sheila Mann criou o POT – Peace On The Table, projeto que propõe unir os povos através da culinária, projeto que hoje se tornou a sua grande razão de viver, e com essa proposta se tornou uma ativista pela paz, principalmente entre árabes e judeus.
No ano passado Sheila lançou um livro de memórias e culinária denominado “Culinária do Líbano a Israel”. Atualmente dá aulas de culinária libanesa na sua própria escola, em São Paulo, e palestras sobre o seu trabalho, tendo formado um grupo de mulheres judias e mulheres árabes que se reúnem para compartilhar experiências e fortalecer laços de amizade .
sheila@peaceonthetable.org
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