FIBROSE PULMONAR – ENTREVISTA COM A DRA. LETICIA KAWANO-DOURADO

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Iremos conversar sobre um tema que tem crescido em importância à medida que a população envelhece (aumento da longevidade). Trataremos do assunto fibrose pulmonar, esclarecendo vários aspectos a esse respeito, especialmente sobre a importância de sua detecção precoce. A Dra. Leticia Kawano-Dourado, médica pneumologista, doutora em pneumologia pela Universidade de São Paulo e pesquisadora colaboradora do grupo de doenças Intersticiais Pulmonares do Instituto do Coração (InCor) FMUSP vai nos falar um pouco sobre o assunto.


P: O que é fibrose pulmonar?

LKD: Fibrose pulmonar é um termo genérico usado para se referir a um grupo de doenças pulmonares que cursam com fibrose (cicatrização) pulmonar. Quando ocorre fibrose no pulmão, ele deixa de funcionar adequadamente, comprometendo seu papel de oxigenar sangue e expelir o gás carbônico. Vide figura 1.

P: Quais são os sintomas da fibrose pulmonar?

LKD: Os sintomas são inespecíficos, como cansaço aos esforços, falta de ar, tosse seca, cianose (arroxeamento de lábios e dedos) e baqueteamento digital (figura 2). Esses sintomas podem estar presentes em outras doenças pulmonares como, por exemplo, asma, enfisema/bronquite (DPOC). A detecção adequada da fibrose pulmonar ocorre por um exame chamado tomografia de tórax de alta resolução.

P: E quais são as doenças que causam fibrose pulmonar?

LKD: São várias as causas de fibrose pulmonar. Desde causas relativamente benignas até formas mais graves. A principal representante desse grupo de doenças é a Fibrose Pulmonar Idiopática, que não deve ser confundida com o termo genérico “fibrose pulmonar”. Outras causas de fibrose pulmonar são: a pneumonite de hipersensibilidade, doenças reumatológicas, reações a drogas ou à radioterapia, relacionadas ao cigarro, ou até como sequela de algumas infecções.

P: Faz diferença saber exatamente a causa da fibrose pulmonar?

LKD: Faz total diferença! A abordagem é completamente diferente. Em alguns casos, a remoção do agente causador é a principal medida para se interromper a progressão da doença. E no caso de um diagnóstico correto de Fibrose Pulmonar Idiopática, a conduta envolve evitar alguns medicamentos, que em outros casos de fibrose são prescritos, além de outras medidas. É muito comum recebermos no serviço de doenças Intersticiais Pulmonares do Hospital das Clínicas FMUSP pacientes referenciados com o diagnóstico de “Fibrose Pulmonar Idiopática” quando, na verdade, o paciente tem outra doença.

P: E como se faz o diagnóstico das diferentes doenças que causam fibrose pulmonar?

LKD: A partir da tomografia de tórax (figura 3) é possível formularmos hipóteses, baseadas no aspecto da tomografia sobre as doenças mais prováveis. Alguns casos necessitam de biópsia, outros não. É fundamental que essa análise seja realizada por profissionais pneumologistas com ampla experiência com doenças intersticiais* pulmonares, para que seja garantida uma avaliação diagnóstica precisa, garantindo essa diferenciação entre os vários tipos de fibrose pulmonar.

* Doenças intersticiais pulmonares é a subespecialidade da pneumologia que trata desse tipo de doença.

P: E sobre a Fibrose Pulmonar Idiopática, que é uma das causas de fibrose pulmonar, o que é tão particular sobre ela?

LKD: A Fibrose Pulmonar Idiopática é a causa mais comum de fibrose pulmonar. É uma doença da senescência (quanto mais idade, maior a chance de desenvolvê-la), que tem um comportamento progressivo. A Fibrose Pulmonar Idiopática associa-se com tabagismo e sexo masculino. Na Fibrose Pulmonar Idiopática, devem ser EVITADOS os tratamentos habituais que usamos para outras formas de fibrose pulmonar (como aquelas associadas às doenças reumatológicas ou a pneumonite de hipersensibilidade) sob risco de aumento da mortalidade. Segundo ponto importante, recentemente foram aprovadas no FDA (órgão de regulação Norte-Americano) e, agora em outubro de 2015, na ANVISA, drogas específicas para o tratamento da Fibrose Pulmonar Idiopática que poderemos lançar mão.

P: E qual a importância da detecção precoce? Há indicação de fazer exame de rastreamento?

LKD: A importância da detecção precoce se resume em dois principais aspectos: A) dependendo da causa da fibrose, há uma série de medidas capazes de reverter e/ou controlar a doença. B) Em se tratando da Fibrose Pulmonar Idiopática, uma identificação e intervenção precoce pode desacelerar a doença, permitindo um planejamento adequado até mesmo em relação à possibilidade de transplante de pulmão. Não há indicação de fazer exame de rastreamento para fibrose, dada a relativa baixa incidência na população geral. No entanto, atualmente se sugere o rastreamento de câncer de pulmão com tomografia de tórax em pessoas entre 55-75 anos, fumantes ou ex-fumantes, população igualmente de risco para Fibrose Pulmonar Idiopática. Desse modo, esse rastreamento para câncer de pulmão serve duplamente para detecção precoce de Fibrose Pulmonar Idiopática.


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Pulmões saudáveis são compostos por vários sacos de ar (alveolos) circundados por vasos sanguineos. Esse arranjo permite ao organismo extrair oxigênio do ar e expelir o gas carbônico produzido. À direita, vemos uma imagem ampliada dos sacos de ar normais (alveolos). Os sacos de ar danificados pela fibrose perdem eficiência em fazer essa troca levando a sensação de falta de ar.

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Sinais e sintomas sugestivos de fibrose pulmonar: tosse seca, falta de ar, perda de peso, cianose (arroxeamento dos lábios) e baqueteamento digitial (mudança da conformação da ponta dos dedos em forma de baqueta de tambor.

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Ilustração do exame de tomografia de tórax. Trata-se de um exame indolor e rápido fornecendo imagem de alta resolução dos pulmões.


Dra Leticia Kawano-Dourado

Médica Pneumologista

Doutora em Pneumologia pela faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP)

Pesquisadora colaboradora do grupo de doenças intersticiais pulmonares da divisão de Pneumologia do InCor- FMUSP

Nota – Imagens retiradas do livro pocketdoctor para pacientes em Fibrose Pulmonar Idiopática, distribuido pela apmps.org.br