A MUTAÇÃO DO ANTISSEMITISMO – POR RABINO JONATHAN SACKS
Nos últimos meses e anos temos visto o retorno e o aumento do antissemitismo na Europa e em todo o mundo. Mas como o antissemitismo mudou no decorrer do tempo? E por que seu retorno hoje apresenta um perigo não apenas para os judeus, mas para todos que se preocupam com nossa humanidade comum?
Dentro da lembrança viva do Holocausto, após o qual o mundo disse que jamais voltaria a acontecer, o antissemitismo retornou.
Mas o que é antissemitismo e por que seu retorno deveria ser motivo para preocupação, não apenas para os judeus mas para todos nós?
Historicamente, o antissemitismo tem sido difícil de definir, porque se expressa em maneiras tão contraditórias. Antes do Holocausto, os judeus eram odiados porque eram pobres e porque eram ricos; porque eram comunistas e porque eram capitalistas; porque ficavam afastados e porque se infiltravam em toda parte; porque se apegavam a antigas crenças religiosas e porque eram cosmopolitas sem raízes que não acreditavam em nada.
Então o que é antissemitismo? Sejamos claros – não gostar das pessoas porque são diferentes não é antissemitismo. É xenofobia. Criticar Israel não é antissemitismo; é parte do processo democrático, e Israel é uma democracia.
O antissemitismo é algo muito mais perigoso – significa perseguir judeus e negar-lhes o direito de existir coletivamente como judeus com os mesmos direitos que as outras pessoas.
É um preconceito que como um vírus, tem sobrevivido no decorrer do tempo por mutação. Na Idade Media, os judeus eram perseguidos por causa de sua religião. Nos séculos 19 e 20 eram desprezados por causa de sua raça. Hoje, os judeus são atacados por causa da existência de seu pais, Israel. Negar o direito de Israel existir é o novo antissemitismo. E assim como o antissemitismo tem mudado, também a sua legitimação. A cada vez, à medida que a perseguição desce até a barbárie, os perseguidores alcançaram a forma mais elevada de justificativa disponível.
Na Idade Media, era a religião.Na Europa pós-Iluminismo era a ciência; o assim chamado estudo científico da raça. Hoje são os direitos humanos.Toda vez que você escuta direitos humanos sendo invocados para negar o direito de existir a Israel, está ouvindo o novo antissemitismo. Então, por que voltou? Há muitas razões mas uma básica é a falha cognitiva chamada bode expiatório.
Quando coisas más acontecem a um grupo seus membros podem fazer uma de duas perguntas: “O que fizemos de errado?” ou “Quem fez isso para nós?” Todo o destino do grupo vai depender daquilo que ele escolhe. Se perguntar: “O que fizemos de errado?”começou o processo de reparar o dano. Se, em vez disso, perguntar “Quem fez isso para nós?” define-se como uma vítima. Irá então procurar um bode expiatório para culpá-lo por todos os seus problemas.
Classicamente isso tem sido os judeus, porque durante mil anos eles foram a minoria não-cristã mais conspícua na Europa e atualmente porque Israel é o pais não-muçulmano mais conspícuo no Oriente Médio.
O argumento é sempre o mesmo. Somos inocentes; portanto eles são culpados. Portanto se quisermos ser livres, eles – os judeus ou o Estado de Israel – devem ser destruídos. É assim começam os grandes males.
Por que então devemos nos preocupar com isso? Afinal, se não somos judeus, o que isso tem a ver conosco? A resposta é que o antissemitismo é sobre a incapacidade de um grupo de abrir espaço para a diferença.
E porque somos todos diferentes, o ódio que começa com os judeus jamais termina com os judeus.
Não foram somente os judeus que sofreram sob Hitler. Não foram somente os judeus que sofreram sob Stalin. Não são somente os judeus que sofrem sob os islâmicos radicais e outros que negam a Israel o direito de existir.
O antissemitismo é o sinal de aviso mais confiável do mundo mostrando uma grande ameaça à liberdade, humanidade e a dignidade da diferença.
Afeta a todos nós. É por isso que devemos lutar juntos contra ele.
JONATHAN HENRY SACKS, Barão Sacks, Kt (nascido em 08 março de 1948), título que lhe foi concedido pela Rainha da Inglaterra, é um rabino e estudioso do judaísmo. Ele foi o Rabino-Chefe das Congregações Hebraicas Unidas da Commonwealth, Londres. Seu nome hebraico é Yaakov Zvi. É fundador e diretor do Meaningful Life Center (Centro para uma Vida Significativa).
http://www.beitchabad.org.br