FILHOS ESPIRITUAIS – RAV EFRAIM BIRBOJM

“Não desista do seu trabalho. Veja onde eu comecei e o que eu me tornei. Você precisa apenas amar seus alunos. Ame-os como se fossem seus próprios filhos, e então você terá sucesso”.


Elisha vivia em Israel e trabalhava com jovens imigrantes afastados da Torá, em um programa para aproximá-los do judaísmo. Certa vez, voltando de uma viagem, começou a refletir. Seu trabalho era pesado, horas de dedicação diária, mas poucos realmente conseguiam mudar de vida. Será que valia a pena todo aquele esforço?

Na metade do caminho, subiu no ônibus um senhor distinto, de barba branca, chapéu preto e casaco preto longo. Parecia ser alguém importante. Ele sentou-se ao lado de Elisha e começaram a conversar. No meio da conversa, perguntou a Elisha com o que ele trabalhava. Elisha contou sobre o trabalho com os jovens e as dificuldades que vinha encontrando. O senhor ficou em silêncio por um momento e, depois de uma pausa, disse com um sorriso:

– No próximo mês eu vou me aposentar do meu cargo de Dayan (Juiz do Tribunal Rabínico). Eu trabalho com isso há 25 anos. Mas não pense que eu sempre fui assim. Eu não cresci em um lar religioso. Meus pais eram sobreviventes do Holocausto e não tinham a capacidade emocional de me dar a atenção que eu precisava. Eu praticamente cresci na rua e estava prestes a me tornar um marginal, pois andava com más influências. Perto da minha casa havia uma sinagoga e, ao lado dela, havia um campo de futebol, onde eu passava bastante tempo com os meus amigos. Certa vez estávamos jogando em pleno Shabat, quando eu tinha 14 anos. Eu chutei a bola com tanta força que ela não apenas caiu no pátio da sinagoga, mas atingiu em cheio o rabino, que estava saindo. Com o forte impacto, o rabino caiu no chão e seu chapéu voou. Meus amigos e eu demos gargalhada daquela cena.

– O rabino pegou o chapéu do chão e caminhou na minha direção – continuou o senhor – Eu estava esperando uma enorme bronca e, por isso, antes que ele pudesse abrir a boca, eu disse de maneira desrespeitosa: “Shabat Shalom, rabino. O senhor veio fazer Kidush para nós ou juntar-se ao nosso jogo?”. Mas, ao contrário do que eu imaginava, o rabino não ficou nervoso. Ele olhou para mim e perguntou: “Onde estão seus pais?”. Eu respondi ironicamente “Eles estão mortos”. O rabino então me convidou para ir à sua casa. Não sei por que, mas aceitei. Talvez porque estava pensando nas piadas que contaria aos meus amigos quando voltasse. Chegamos à casa dele, ele fez Kidush e me perguntou se eu estava com fome. Quando respondi que sim, o rabino fez um sinal para sua esposa e mais um prato foi colocado à mesa. Me trouxeram comida e comi como se não visse comida há dias. O rabino comeu pouco e disse algumas palavras de Torá. Anos mais tarde, entendi que tinha comido a porção dele.

– Quando terminei de comer, o rabino me perguntou se eu estava cansado – o senhor contava, emocionado – Respondi que estava exausto. O rabino me ofereceu uma cama e eu imediatamente adormeci. Quando acordei, já era Motzei Shabat. O rabino me perguntou o que eu iria fazer. Respondi que adoraria ir ao cinema, mas que não tinha dinheiro para o ingresso. O rabino perguntou quanto custava, foi ao seu quarto e voltou com aquela quantia. Ele se despediu de mim, mas disse: “Volte amanhã”. Voltei no dia seguinte, e no próximo, e também no próximo. Comi e ganhei dinheiro para o cinema dia após dia. Acabei descobrindo que haviam outras 12 crianças que, como eu, foram tiradas da rua e recebiam comida. Comecei a me apegar muito a ele. Ele começou a me ensinar sobre judaísmo e, como eu não queria ser ingrato, ouvia com atenção. Ele me comprou um par de Tefilin e sentou-se para estudar comigo. Graças a ele, finalmente fui a uma Yeshivá. Anos mais tarde recebi a ordenação rabínica e, como você pode ver, tornei-me Dayan. Ele fez o meu casamento, dos meus filhos e foi o Sandak do meu neto.

Quando o ônibus estava chegando, o senhor terminou sua história e concluiu: “Não desista do seu trabalho. Veja onde eu comecei e o que eu me tornei. Você precisa apenas amar seus alunos. Ame-os como se fossem seus próprios filhos, e então você terá sucesso”.

As pessoas começaram a se preparar para descer do ônibus e Elisha conseguiu fazer uma última pergunta antes de se despedir: “Espere, qual era o nome do rabino que o recebeu em casa?”. O senhor respondeu, com um enorme sorriso: “O nome dele é Rav Ovadia Yosef zt”l”.


RAV EFRAIM BIRBOJM – Mestre em Engenharia pela Escola Politécnica da USP, começou seu processo de Teshuvá (retorno ao judaísmo) aos 25 anos, através da Instituição “Binyan Olam”. Saiba mais.

Email:

20
20