OSTROWIEC, POLÔNIA, PIEDOSA E PUJANTE COMUNIDADE JUDAICA – POR ISRAEL BLAJBERG

Naquele domingo fatídico de 12 de outubro de 1942 os nazistas evacuaram todos os habitantes do gueto, conduzindo mais de 10 mil judeus à pé através da cidade em direção à periferia, onde, no pátio de manobra, aguardavam os trens que os levariam a Treblinka.


A meio caminho entre Varsóvia e Cracóvia, de Ostrowiec partiram inúmeros imigrantes que escolheram o Brasil. São muitos os descendentes daqueles que palmilhavam o Rynek e as ruas de terra. Chegou a ter maioria judaica de habitantes até aquele domingo fatídico de 12 de outubro, quando os nazistas evacuaram todos os habitantes do gueto, conduzindo mais de 10 mil judeus à pé através da cidade em direção à periferia, onde no pátio de manobra aguardavam os trens que os levariam a Treblinka, onde foram cruelmente assassinados.

A marcha durou até o anoitecer. Os inocentes, condenados sem culpa, entoavam cânticos religiosos. Alguns poucos sobreviveram escondidos ou em trabalho forçado. O Shtetl secular desaparecia, com 1/3 dos seus habitantes condenado à morte apenas por serem judeus. A cidade foi cercada por homens da SS, Schutzpolizei, gendarmes lituanos e polacos. Policiais foram de porta em porta, ordenando que as pessoas saíssem levando um máximo de 10kg de pertences, e todo seu dinheiro e objetos de valor. Não havia para onde ir, estavam cercados sem saber o que fazer. A marcha durou do amanhecer ao anoitecer, até o pátio da escola primária da Rua Sienkiewicz, bonita alameda que lembra as ruas arborizadas de Teresópolis. Hoje a escola tem um moderno parque infantil em volta, onde as crianças brincam sem ao menos desconfiar do passado negro daquele lugar. Nada identifica este local de martírio, equivalente a Umschlagplatz de Varsóvia.

Um monumento aos judeus que deixaram Ostrowiec naquele inominável 12 de outubro de 1942 demorou 71 anos para finalmente ser inaugurado, em 2015. A placa recorda “cerca de 15 mil judeus de Ostrowiec Swietokrzyski e seus arredores assassinados durante a Segunda Guerra Mundial pelos genocidas alemães – Aqui se erguia uma sinagoga profanada e destruída pelos ocupantes alemães”.

Em algum lugar do terreno onde existiu o grande cemitério judaico, vandalizado logo após a guerra já sob o tacão soviético, há uma vala comum. Hoje o local é um parque, área verde com arvores centenárias, erguido sobre o campo santo. Sobre a pequena fração do terreno que restou, sobreviventes reuniram matzeivot (lápides) formando uma espécie de mostruário. Elas já não identificam o local dos enterros, pois foram recolhidas para dar lugar ao parque. Hoje tem-se apenas este pequeno cemitério simbólico, à cuja entrada foi erguido um lapidarium, monumento construído com fragmentos de lápides partidas.

Tudo era perto em Ostrowiec, Rynek: cemitério, sinagoga, Midrash, concentrados em uma área central da cidade que pode ser facilmente percorrida a pé. A bela sinagoga de madeira foi totalmente queimada pelos nazistas.

Hoje não há sequer um único judeu na cidade. Eles haviam chegado na Polônia em tempos imemoriais. Tantas histórias, tantos testemunhos. Já se passaram séculos … Kazimierz o Grande e sua amada Esther, Vaad Arbá Aratzot (Conselho das 4 Terras), “Paradisus Iudaeorum”, o bravo Coronel Berl Joselewicz, a partilha da Polônia pelos Impérios da Rússia, Prússia e Austro-Húngaro, a Independência após 123 anos, Pilsudski, Katyn, Anders, Jedwabne, Levante do Gueto, Holocausto, Levante de Varsóvia, judeus sempre presentes na paz ou na guerra, sob a bandeira da Águia Branca, Polonia Restituta. .. pogrom de Kielce, as trevas do regime comunista, Nostra Aetate, Karol Wojtyla, música Klezmer, Força Aérea de Israel sobrevoa Auschwitz … Renascimento …

O trágico 12 de outubro de Ostrowiec é no Brasil o Dia da Padroeira, Nossa Senhora Aparecida, e Dia da Criança. Tantos judeus aqui chegaram, vindos do país profundamente católico onde nasceu Karol Wojtyla, o Papa polonês. Dia também das crianças, que remete ao 1,5 milhão que não pôde chegar à idade adulta, colhidas na tragédia do Holocausto que se abateu sobre as pequenas vitimas inocentes, apenas por serem judias.

Os crimes dos pérfidos nazistas e seus infames colaboradores não serão jamais esquecidos nem perdoados, com a Marca de Caim causticando as suas frontes.

Ao recordar os mártires que pereceram pelo Santificado Nome, nós descendentes somos as testemunhas da Eternidade de Israel, nesse 12 de outubro dedicando nossos pensamentos aos mártires de Ostrowiec que pereceram Al Kiddush haShem.

Eles eram as folhinhas de uma árvore frondosa que vicejou na Polonia gelada e sofrida, cujas sementes atravessaram os mares, fazendo com que no Brasil novamente brilhasse a esperança de um futuro melhor, para toda a Humanidade.


Israel Blajberg – Brasileiro nato de 1ª. geração com raízes em Ostrowiec e Ilza, Polonia

iblajberg@poli.ufrj.br

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