DEVER DE INDENIZAR POR FALTA DE AFETO – POR MOYSES SIMÃO SZNIFER

Existe direito ao afeto? A falta de afeto gera a obrigação de indenizar?

O pagamento de compensação financeira pelo denominado “abandono afetivo” tem gerado inúmeras controvérsias na doutrina e na própria jurisprudência dos Tribunais, havendo decisões divergentes inclusive entre Câmaras e Turmas de um mesmo pretório.
Pode-se afirmar que a discordância fundamental, via de regra, reside em estabelecer um entendimento uniforme quanto a existência ou não, de amparo legal para obrigar um pai ou uma mãe a indenizar seu filho (a) caso não tenha lhe propiciado afeto, amparo, carinho, atenção, amor, durante fases importantes de sua vida como a infância e a adolescência.

Em síntese: Existe direito ao afeto? A falta de afeto gera a obrigação de indenizar?

A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) proferiu decisão, por maioria de votos (cinco a quatro), que obrigou um pai a pagar à filha indenização de R$ 200.000,00 por abandono afetivo, adotando o entendimento de que o abandono era passível de indenização por dano moral.

Conforme veiculado pelo “portal G1”, a filha ingressou com ação contra o pai alegando abandono material e afetivo durante a infância e a adolescência. A maioria dos ministros integrantes da mencionada seção, destacaram que trata-se de um caso “excepcional” porque houve discriminação entre os filhos.

O Tribunal de Justiça de São Paulo havia condenado o pai e fixado indenização por danos morais em R$ 415.000,00. O genitor recorreu ao STJ alegando não ter abandonado a filha e argumentando que, mesmo se isso tivesse ocorrido, não “haveria ilícito indenizável”, invocou ainda que o distanciamento de sua filha decorreu do comportamento agressivo da mãe dela.

Ao proferir seu voto, o ministro Marco Buzzi afirmou que não se pode afastar a responsabilidade do pai sobre a filha pelo comportamento da mãe: “A conduta da mãe não justifica ausência do pai nos fatos da vida da filha”, afirmou. Para ele, os autos mostram que o pai agiu de forma discriminatória com a filha. “O caso trata de evidentes e injustificáveis discriminações, abandono moral, desvio de bens e tratamento vexaminoso”, disse.

Destacou que no caso “não se trata de compensar danos extrapatrimoniais diante de fatos corriqueiros ou falta de amor”.”Amor não pode ser cobrado, mas afeto compreende também os deveres dos pais com os filhos. […] A proteção integral à criança exige afeto, mesmo que pragmático, e impõe dever de cuidar.”

Ressaltou que diversas leis, como o Código Civil, a Constituição e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), impõem deveres concretos de cuidado pelos pais. “Não se trata de uma impossível obrigação de amar, mas de um dever impostergável de cuidar”, concluiu o ministro.

Em nosso entendimento há amparo no ordenamento jurídico nacional para a condenação imposta, pois aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito e está obrigado a reparar todos os danos causados à vítima, consoante se depreende das disposições constantes dos artigos 186 e 927 do Código Civil.

Além disso, cumpre igualmente destacar que se constitui em direito fundamental da pessoa humana a reparação devida por danos materiais, morais ou à imagem, consoante previsão constante do art. , incisos V e X da Constituição Federal.


Moyses Simão Sznifer – Advogado/Mestre em Direito das Relações Sociais pela PUC/SP; Especialista em Contratos e Obrigações pela ESA/SP; Ex-Membro do Ministério Público da União; Professor Universitário.

moyses18@uol.com.br

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