PESSACH! COMO DERROTAR O FARAÓ HOJE? – POR RAV SANY SONNENREICH
Trabalhar longas horas, dia após dia, por décadas. Você é bom no que faz e bem pago. Enfrenta o trânsito todas as noites, chega em casa exausto demais para fazer outra coisa além de relaxar e ir para a cama. Em algum nível isso o atormenta. Certamente há mais na vida do que compras e recados. Em momentos de silêncio, uma pequena voz se contorce na cabeça. É a voz da grandeza, chamando para perseguir um propósito maior.
Impulsionado pelas dores da mediocridade, corajosamente marca um encontro para falar com o chefe. Solicita uma breve licença para limpar a mente, olhar para dentro e se concentrar nas prioridades da vida. O chefe acena com a cabeça e sente seu comprometimento enfraquecido. Argumenta sobre o seu tempo livre que, na opinião dele, já é muito. A resposta vem dura e clara: “Pedido de férias rejeitado. Além disso, estou aumentando sua carga de trabalho. Obrigado, isso é tudo”.
Tal foi a experiência judaica da escravidão há 3.300 anos no Egito. Inicialmente, os judeus se ofereceram para participar da campanha de obras públicas para construir as cidades-armazéns de Pitom e Raamsés. Só mais tarde o faraó tornou o trabalho obrigatório, escravizando os judeus. Para os judeus, às vezes, parecia que todo o empreendimento não tinha outro motivo senão mantê-los ocupados. Em um jogo de palavras, o Talmud define “Raamsés” como onde os edifícios desabaram repetidamente (mitroses) e “Pitom” como o abismo (pi-tehom) que engoliu cada edifício como areia movediça.
Apesar do trabalho insuportavelmente longo e difícil, o projeto nunca foi concluído. A vida era mundana, sem sentido e sem propósito. As agitações do destino nacional, porém, não puderam ser contidas. Os judeus finalmente chegaram a um ponto em que a dor de “permanecer o mesmo” era mais dura que a da mudança. Quando finalmente gritam em desespero, D”us diz a Moisés para pedir uma licença de três dias no deserto.
Em oposição estava o faraó, o homem mais poderoso vivo. Adorado como uma divindade, fazia escolhas egoístas que prejudicavam aos outros, enquanto beneficiavam sua própria riqueza e status. Somente D”us estava entre o faraó e o seu governo global narcisista. Para proteger o ego de tamanho divino, não permitiria que essas agitações judaicas crescessem. A resposta foi rápida e furiosa: manter a cota de produção dos judeus e eliminar o fornecimento de materiais de construção. A tática do faraó era “trabalhar sem interrupção”, manter os judeus ocupados e distraídos, tirando qualquer tempo livre para contemplar coisas além da sobrevivência. “Volte a estar ocupado!“.
Embora Moisés assegure aos judeus que a escravidão terminará em breve, eles não ouvem devido à falta de ar e ao trabalho duro ( Êxodo 6:9 ). Estão sobrecarregados e oprimidos, não conseguiam encontrar um momento de equilíbrio, para se conectar com o senso de propósito mais elevado.
E, assim, é para nós hoje. A “escravidão egípcia” é uma metáfora para a condição humana. Como dizemos no Seder de Pessach: “cada pessoa é obrigada a se ver saindo pessoalmente do Egito“. Isso é especialmente verdade em nosso tempo, com distrações em todos os lugares. Uma máquina de mídia implacável nos bombardeia com dezenas de milhares de mensagens todos os dias, provocando mudança de foco a cada instante: Instagram, Facebook, Gmail, WhatsApp. Toda vez que o telefone emite um ping ou vibra com uma notificação, a atenção é desviada repetidamente.
Desde 2000, o tempo de atenção caiu de 12 segundos para 8. Sim, a vida é corrida. Com telas de vídeo em todos os lugares e uma sempre em nossas mãos, sofremos da “Síndrome Sem Tempo para Pensar”, um sinistro estado de distração com pouco tempo para refletir sobre a maior questão da vida: por que estou aqui? Esta é precisamente a tática do faraó: envolvê-lo em batalhas de baixa prioridade sobre as minúcias da vida. Ele está apostando que, ao mantê-lo distraído, você não enfrentará mais a verdadeira batalha de adicionar mais significado e propósito à vida. Para que a máquina de dinheiro do faraó produza melhor, seus “anseios de grandeza” devem desaparecer em silêncio.
Como nos livramos desse pântano mundano e ganhamos perspectiva sobre nossas prioridades? Qual é a chave para se libertar?
No Egito, a solução envolveu três dias no deserto para experimentar o D”us de compaixão, liberdade e autorrealização. O deserto é um lugar desconectado da rede, desprovido de todas as distrações. Hoje, também, precisamos “ir ao deserto”, um lugar tranquilo para focar totalmente. Essa é a magia dos nossos Chaguim, de nossas festas! Elas estimulam o pensamento em prol de perguntas essenciais:
• Para quê estou vivendo?
• O que torna a vida significativa?
• Em que situações me sinto mais presente e vivo?
• Se as circunstâncias permitissem, o que eu faria apaixonadamente todos os dias, de graça?
• Minhas ações estão no caminho certo para o meu propósito de vida único?
Estes são alguns tipos de pensamentos que o faraó quer encerrar. Em hebraico, Egito é Mitzrayim da raiz, mey-tzar , que significa estreito e confinado. O segredo para sair dessa é ir para um lugar sem distração, um lugar onde algo mais autêntico ocupe o espaço. Esta é a oportunidade que a festa de Pessach nos proporciona. É a época das flores da primavera, onde a renovação está no ar. A hora de derrotar as forças que desviam nossos valores mais profundos. Neste Chag, respire fundo e saboreie a verdadeira liberdade.
Pessach Kasher Vê Sameach!
RAV SANY SONNENREICH
Rabino Diretor dos centros Makom Jardins-Moema – São Paulo