Dachau.  Como dominar um país. Lições  – Por Felipe Daiello

Não muito longe de Munique usando os trens rápidos do metro, o S1, chegamos à pequena povoação de Dachau, onde, usando o ônibus circular 726, podemos encontrar outro centro de memória da Alemanha de Hitler. Ao alcançar a posição de Chanceler em 1933, com apoio das SA, grupo paramilitar, com seus uniformes marrons em marchas organizadas, que usa a violência para intimidar os adversários, Adolfo Hitler está pronto a cumprir os planos que apresenta no seu livro Mein Kamft. Nos primeiros decretos fala dos inimigos políticos da Alemanha, parasitas da economia quer precisam ser eliminados. Numa área de Dachau onde instalações de antiga fábrica de munições estão abandonadas é o local perfeito para instalação do primeiro campo para abrigar inimigos do Estado. Os primeiros condenados em torno de 1.800 pessoas, incluindo comunistas, líderes sindicais, professores universitários são os primeiros hóspedes, que além disso precisam realizar as demolições necessárias, a construção das barracas dos prisioneiros, a áreas da administração, os muros de contenção, os serviços médicos, de higiene, as cozinhas e refeitórios.

Sob supervisão das SS, tropas de elite com suas vestes negras e caveira no quepe incorporam o protótipo do guerreiro ariano e a inauguração provisória ocorre em 1935/36, com a presença de Hitler e de Himmler.

No começo as comunidades hebraicas que não chegavam a 2% da população foram poupadas das perseguições e prisões, mesmo com as constantes notícias antissemitas, o pior, a propaganda enaltecia o governo e as ações de rearmamento nacional , processo que contava com as simpatias e o apoio das grandes fortunas da Alemanha. Pouco a pouco, uma névoa escura contamina a consciência germânica onde princípios e normas de conduta são destruídos pelas massivas mensagens hitleristas.

A suástica , nova cruz de ódio. constrói uma única nação, onde os contrários não têm voz e precisam ser eliminados em favor do Terceiro Reich, construção para durar mil anos. Cegueira ideológica contamina toda a Alemanha.

Vinte anos decorridos, os escritos de Franz Kafka apresentam o comportamento usual de regimes totalitários: presos sem processo, acusados sem possibilidade de defesa por juízes que não vemos, condenados sem ter direitos, sem embargos, sem advogados ou recursos. Agora somos apenas um número gravado no pulso, onde a morte é o destino de todos. Projetado inicialmente como campo de detenção com capacidade para seis mil detentos, no início de 1945, em pleno inverno, superlotado abrigava mais de 20 mil prisioneiros, a maioria transferida de outras áreas da Europa, sob ataque pesado das tropas soviéticas.

Dentro da filosofia e das características germânicas, o campo de Dachau, como unidade industrial da morte, com registros de todos os infelizes ali aprisionados, foi copiado e ampliado por toda a Europa, dentro das regras da Solução Final para as comunidades judaicas. Na entrada, no portão principal, cartaz com o dito Arbeit Macht Frei é um escárnio para os que chegam.

Quando os americanos chegam a Dachau em abril de 1945, o inferno está presente. Mortos vivos, pele e ossos pela desnutrição, estão rodeados de cadáveres insepultos. A fome , a cólera e o tifo cobram taxa pesada. O comandante americano obriga os civis de Dachau a sepultar os cadáveres , muitos ainda dentro dos vagões usados no transporte. Modo da população local verificar e confirmar o que acontecia na periferia. Alguns dos guardas do campo capturados, identificados , pelo horror das provas e das acusações foram fuzilados no momento, outros capturados pelos prisioneiros foram trucidados por mão vazias ou com pedras, com facas e paus.

Durante a ocupação americana alguns dos prédios servem de alojamento, enquanto parte do campo começa a ser desmontado. No entanto, antes do desmantelamento completo do complexo , a ideia de manter um local que preserve as memórias desse holocausto para as novas gerações é posta em prática. Através de fotografias, de cartazes oficiais, de fotos pessoais, de cartas e de escritos dos que sobreviveram, das pinturas , dos grafites colocados nos tetos e nas paredes por desesperados, as manchetes dos cartazes oficiais, das reportagens nos jornais da época podemos acompanhar o que era a vida de um detento.

As salas de banho onde em vez de água era colocado gás mortal, os crematórios manuais , as cercas de arame farpado e eletrificadas, as torres de vigilância e agora os centros religiosos que homenageiam os cristãos , os russos ortodoxos , os judeus e mesmo aos ateus, aqui falecidos, mostram a que grau a crueldade humana pode chegar.

Nas projeções de audiovisual, onde os centros de detenção e de extermínio estavam ligados por rede ferrovia com mais de 39 mil quilômetros , com diferença de bitolas dos trilhos e usando todo tipo de trens e de vagões existentes na Europa, a máquina de guerra alemã dependia também dessa estrutura para movimentar tropas, equipamentos, munições e alimentos. Depois de conquistar a Europa e a Polônia, não conseguindo vencer a guerra aérea com a Inglaterra, a operação Barbarrossa ao invadir a Rússia tem problemas de logística. As frentes de batalhas ficam cada vez mais distantes dos centros de apoio na Alemanha, Enquanto as tropas soviéticas mesmo em retirada estão perto de casa. Depois a população das repúblicas soviéticas é mais do que o dobro da população alemã. Não esquecer que as fábricas russas de armamento, de tanques e de aviões, além dos Urais estavam fora do cerco e da queda de Stalingrado em 1943, e do fracasso de romper as linhas russas em Kursk em 1943, quando Hitler perde a possibilidade de novas ofensivas na frente oriental alcance dos bombardeiros leves da Luftwaffe.

Sem uma vitória rápida, Hitler teria problemas que as vitórias iniciais escondiam.

Com mais de seis milhões de soldados envolvidos na frente leste, mesmo com apoio de italianos , de romenos, dos croatas era preciso dispor de mais operários nas fábricas da Alemanha. Começa a operação de transferir dos países ocupados, além de prisioneiros de guerra, a mão de obra forçada para substituir os alemães que estavam sendo engajados. Milhões de pessoas, de todos os cantos superlotam as vias férreas, principalmente após o fracasso do ataque a Moscou em 1941, do cerco e da queda de Stalingrado em 1943, e do fracasso de romper as linhas russas em Kursk em 1943, quando Hitler perde a possibilidade de novas ofensivas na frente oriental.

Mesmo assim continua o projeto de exterminar os judeus, o que exige mais guardas nos campos de concentração que estão sendo ampliados, do envio de vagões de todos os cantos da Europa para a Polônia e Hungria, levando pessoas de todas as nacionalidades, infelizes confinados em guetos diversos, vão sobrecarregar o esforço de guerra dos nazistas, agora sofrendo bombardeios nas suas principais cidades pelos aviões ingleses e americanos. Hitler não sabe que perdeu a guerra, mas continua o holocausto.

Joseph Goebbels com PhD em Heidelberg, usou os seus ensinamentos para criar nova técnica de propaganda. Emprega o rádio para transmitir os discursos de propaganda do Furher, agora escutados por milhares da alemães, com o emprego de aviões possibilita comícios em 3 locais diferentes por dia, com legislação que elimina primeiro os parasitas do Estado e depois os inimigos do Reich, aos poucos controla os jornais e os tribunais da Alemanha. Desde 1933 uma nuvem de medo domina a população germânica incapaz de reagir às intensidades dos discursos e atos de Hitler, algo que vai acabar com o Reich de mil anos e destruir a Alemanha. “Narrativas citadas muitas vezes passam a ser verdades.”


FELIPE DAIELLO

FELIPE DAIELLO – Professor, empresário e escritor, é autor de inúmeros livros, dentre os quais “Palavras ao Vento” e ” A Viagem dos Bichos” – Editora AGE – Saiba mais.

www.daiello.com.br

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