ROBÓTICA E CÂNCER DE PRÓSTATA – ENTREVISTA COM O DR. DAVID J. COHEN

DAVID


Atualmente nos EUA, cerca de 90% das cirurgias de câncer de próstata são realizadas através da robótica.

Após passar um período nos Estados Unidos, onde fez um Fellowship pela Universidade de Cornell, o urologista Dr. David Jacques Cohen, que é formado pela PUC – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, especialista em Urologia pela Sociedade Brasileira de Urologia (TisBU-SP), médico do Hospital Israelita Albert Einstein, da Clínica Urosadi e assistente da disciplina de Urologia do Instituto do Homem (Hospital Estadual Euclides de Jesus Zerbini – Hospital Brigadeiro), nos concede esta entrevista sobre a cirurgia robótica, destrinchando o tema em seus mais diversos ângulos. E vai além, trazendo as últimas novidades apresentadas no Congresso Americano de Urologia realizado em maio passado em San Diego, no que se refere ao câncer de próstata, que se constitui no câncer mais comum da humanidade, ocorrendo em um a cada seis homens – no Brasil, cerca de 60 mil novos casos foram estimados somente em 2012, de acordo com Instituto Nacional do Câncer (INCA).


P – Você está voltando dos Estados Unidos, onde fez um Fellowship em cirurgia robótica, no Hospital Cornell. Fale-me sobre isto.

R – No último mês de maio fiz um Fellowship pela Universidade de Cornell em Nova York. Durante aqueles 30 dias observei diversas cirurgias robóticas urológicas, principalmente a cirurgia voltada para o câncer de próstata. Atualmente nos EUA, cerca de 90% das cirurgias de câncer de próstata são realizadas através da robótica.

P – E no Brasil, desde quando a robótica é feita?

R – No Brasil, apesar da primeira cirurgia robótica datar de 2008, este tipo de cirurgia ainda se encontra nos estágios iniciais, principalmente se compararmos com a situação nos Estados Unidos. As principais cirurgias realizadas estão nas áreas da Urologia (cirurgia do câncer de próstata) e da Coloproctologia. Algumas outras áreas também estão começando a utilizar a robótica como é o caso da ginecologia e da cirurgia cardíaca. Ainda são poucos os hospitais que possuem o aparelho de robótica. Em São Paulo a maioria deles são hospitais particulares como o Albert Einstein, Sírio-Libanês, Oswaldo Cruz e Nove de Julho. Apenas um hospital publico, o ICESP – Instituto de Câncer do Estado de São Paulo, possui o aparelho de robótica adquirido no mês passado.

P – Em quais casos se aplica a cirurgia robótica?

R – Basicamente a cirurgia robótica tem as mesmas indicações da cirurgia convencional nos casos de câncer de próstata. O que muda é o modo de realizar a cirurgia.

P – Quais as diferenças entre a cirurgia robótica e as cirurgias tradicionais?

R – A cirurgia robótica é realizada através de um console em que o cirurgião, sem a necessidade de estar paramentado, comanda braços do robô chamado Da Vinci dentro do paciente e, desta maneira, realiza o procedimento. Faz-se necessária a presença de um auxiliar no campo operatório para posicionar de maneira correta o robô, e além disso auxiliar durante o procedimento em algumas manobras que não são possiveis de serem realizadas pelo cirurgião principal através do console. Os braços do robô possuem rotação de 360 graus, permitindo manobras não posssiveis de serem realizadas pela mão humana. Além disto, no console a visão é tridimensional, eliminando a falta de perspectiva de profundidade existente na cirurgia videolaparoscópica. Uma desvantagem é a ausência de palpação durante o ato cirúrgico, que pode ser útil em algumas situações.

P – Quais os benefícios que a robótica traz ao paciente em relação a outros tipos de cirurgias?

R – Os principais benefícios são:

1) Cicatrizes cirúrgicas muito menores: cerca de 6 incisões abdominais de 0,5 a 1cm (na cirurgia convencional se faz uma incisão única de cerca de 5 cm). Isto leva à maior satisfação estética por parte do paciente, além de menor risco de infecção da ferida operatória no período de convalescência.

2) Menor perda sanguínea no intra operatório com menor necessidade de transfusões sanguíneas.

3) Menor tempo de internação hospitalar.

4) Retorno mais rápido do paciente às suas atividades rotineiras.

No entanto, é importante deixar claro que ainda não há dados que demonstrem que a cirurgia robótica tem melhores resultados em prevenir os temidos efeitos colaterais da cirurgia da próstata, que são a disfunção erétil e a incontinência urinária. Além disso, por ser uma terapia nova não há dados quanto à sua segurança oncológica a longo prazo.

P – A cirurgia robótica é mais cara que a convencional?

R – Sem dúvida nenhuma é uma cirurgia muito mais cara que a convencional, pois demanda a compra do aparelho de robótica, dos instrumentos especiais necessários para utilização no robô e da manutenção do mesmo.

P – Quanto ao câncer de próstata, quais são os seus sintomas?

R – Geralmente o câncer de próstata é uma doença silenciosa, por isto a importância de se realizar a prevenção de forma periódica. É o crescimento da próstata não relacionado ao câncer que costuma apresentar sintomas urinários como dificuldade miccional, dor ao urinar e sangue na urina, principalmente em homens acima dos 60 anos. No entanto, é possível que uma pessoa tenha a próstata aumentada e simultaneamente câncer de próstata, mais uma vez demonstrando a importância da prevenção com os exames periódicos e a avaliação de um urologista no caso de aparecimento de sintomas urinários.

P – Quando e como deve ser realizado o exame de próstata?

R – Classicamente a prevenção do câncer de próstata deve ser realizada anualmente em homens com mais de 45 anos, através do toque retal e do exame de sangue – PSA. Em homens da raça negra e/ou histórico familiar de câncer de próstata, é recomendável que a prevenção se inicie a partir dos 40 anos.

P – Com os atuais exames, como o PSA, é possível dispensar exames pela via retal?

R – Até o momento os exames de PSA e toque retal são complementares um ao outro na detecção do câncer de próstata. Atualmente, o que está se discutindo, e foi uma das novidades do último Congresso Americano de Urologia realizado em maio deste ano em San Diego, é de que, com o uso do PSA, uma grande quantidade de câncer de próstata foram diagnosticados, inclusive aqueles com baixo potencial de letalidade muitas vezes em indivíduos mais idosos, que provavelmente morreriam de outras causas e não do câncer de próstata, mas mesmo assim foram tratados e sofreram os efeitos colaterais dos tratamentos voltados para o câncer de próstata (incontinência urinaria, disfunção erétil e etc.) e pioraram a sua qualidade de vida. Isto é denominado em inglês overtreatment. Sendo assim, a partir deste ano, segundo a Associação Americana de Urologia, a prevenção deve ser realizada a cada dois anos através do PSA desde os 50 anos de idade em homens sem fatores de risco para a doença e 45 anos em homens com fatores de risco. Na minha opinião, esta atitude está correta do ponto de vista da medicina populacional, uma vez que, com estes critérios, a porcentagem de câncer clinicamente importantes não detectados é muito baixa. Por outro lado, do ponto de vista individual é complicado, pois apesar de estatisticamente ter baixa incidência, casos fora da normalidade ocorrem na medicina.

P – O câncer de próstata tem cura?

R – Sim, principalmente se diagnosticado nas fases iniciais.

P – Quais são as opções de tratamento para o câncer de próstata?

R – O tratamento vai depender do estadiamento da doença, idade do paciente e a presenca de outras doenças associadas. De maneira geral, os principais tratamentos são: a cirurgia (convencional, laparoscópica ou robótica), radioterapia (convencional ou braquiterapia) e hormonioterapia. A quimioterapia é reservada apenas para estágios avançados em que as outras terapias não tiveram eficácia.

P – Quais são as complicações mais comuns da cirurgia para retirada da próstata?

R – As complicações mais comuns da prostatectomia radical (cirurgia de retirada da próstata), seja pela via convencional, laparoscópica ou robótica, são a disfunção erétil (ocorre em 50 – 60% dos casos) e a incontinência urinária, presente em 5 – 8% dos casos.

P – Segundo pesquisas recentes, consta que nos últimos dez anos, os casos de câncer de próstata em homens mais jovens aumentaram. A que causa é atribuída isto? E com que idade, então, recomenda-se iniciar exames de prevenção?

R – Este aumento da incidência do câncer de próstata não foi acompanhado de um aumento na mortalidade, o que significa que, com o uso indiscriminado do PSA na prática clínica, foram detectados cânceres “clinicamente insignificantes” e esses pacientes submetidos a tratamentos não necessários que pioraram a sua qualidade de vida. A etiologia do câncer de próstata não é totalmente esclarecida. Sabemos que há uma influência genética/hereditária, da idade, da alimentação e de processos inflamatórios locais da próstata. Isto significa que talvez algo, em nosso estilo de vida atual, que ainda não conhecemos, esteja aumentando esta incidência. No entanto, a tendência atual das principais associações urológicas mundiais é iniciar mais tardiamente a prevenção do câncer de próstata, de forma que não ocorra um overtreatment.

P – O que acha da técnica criada recentemente por químicos da Universidade da Califórnia em Irvine (EUA) para identificar claramente, pela urina, os biomarcadores do câncer de próstata? Segundo eles, um simples exame caseiro detectará o câncer.

R – Os biomarcadores urinários ainda estão em fase de desenvolvimento e podem ser, em um futuro próximo, um bom auxiliar do PSA para selecionar quais pacientes devem realizar a biópsia de próstata.


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