ANGELINA E A PREVENÇÃO NA SOCIEDADE PATOFÓBICA – DR. PAULO ROSENBAUM
Médico e escritor, assina a coluna semanal “Coisas da Política”, no JB – Jornal do Brasil. Possui graduação em Medicina pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUCSP-1986), mestrado em Medicina (Medicina Preventiva) pela Universidade de São Paulo (1999) e doutorado em Ciências pela Universidade de São Paulo (2005), pós doutor pela Universidade de São Paulo.(2010).
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Reavaliando preconceitos e aversões, celebridades têm mesmo seu valor. A atriz Angelina Jolie expandiu drasticamente sua fama com a notícia da mastectomia total bilateral à qual se submeteu depois de detectar através de exames, o risco de no futuro poder desenvolver uma neoplasia maligna na mama.
A decisão provocou corrida aos exames genéticos e intermináveis polêmicas, mas, pelo que se lê e ouve, estamos muito distantes de qualquer consenso, sequer de um debate racional. Como sempre, debates opinativos se transformam em posturas sectárias e apriorísticas: “eu também faria, tem toda a razão” ou “que absurdo, ela deve ter tido razões ocultas para tomar essa decisão”. Assim é que não se vai muito longe. A verdade é que exames de mapeamento heredo-genético ainda estão em fase de pesquisas. Neste estado embrionário, bem poucas cidadãs podem se esclarecer ouvindo e lendo as discussões travadas na mídia.
Vamos voltar um pouco para tentar reconstituir as razões, o contexto e os parâmetros científicos que costumam nortear decisões terapêuticas.
Toda a ideia da epidemiologia clínica sempre foi tentar esclarecer e distinguir os fatores que expõem (com potencial para impactar negativamente a saúde) daqueles que protegem o sujeito (deixar o organismo menos vulnerável). Como saber? Estabelece-se uma linha de risco. O risco é uma linha subjetiva, ainda que possa ser transformado em índice matemático sob dados estatísticos. A saber, existem procedimentos clínicos, nutritivos, hábitos de vida, e ambientais que protegem a pessoa, assim como aqueles que a tornam mais vulnerável.
Então de onde emerge a subjetividade e toda a assim chamada “arte” em medicina?
A medicina não é ciência stricto sensu, no máxima ciência operativa como alguns epistemólogos ousaram classificar. A arte mencionada se deriva da necessidade de ponderar cada caso em seu devido contexto de individualidade e peculiaridade. Isso torna as regras clínicas mais flexíveis. Alguns reclamam deste caráter relativizador que a medicina adota. Ainda bem que ele existe! Na verdade, trata-se de um importante esteio de segurança para que a pessoa enferma não seja reduzida a um mero protocolo.
Em outras palavras, todas as decisões terapêuticas: do parto via cesariana ao transplante cardíaco, dependem pois de criteriosa avaliação do médico, dos cuidadores, da família, da história pregressa, das condições e contextos da pessoa enferma.