O ACORDO ISRAEL-EMIRADOS ÁRABES UNIDOS – POR DAVID S. MORAN

A surpreendente e histórica notícia do acordo que deverá levar a relações entre Israel e o conjunto de 7 países que formam os Emirados Árabes Unidos, tem vários aspectos. Num governo instável, como é o atual governo de Israel e ao mesmo tempo a campanha eleitoral americana, na qual o presidente Trump também quer mostrar aos americanos algum trunfo, esta declaração é vista por alguns, como uma jogada eleitoral.

O Primeiro Ministro Netanyahu, quando na coletiva na TV, deu aval histórico comparando-se ao Menachem Begin, que assinou um tratado de paz com o maior país árabe que guerreou contra Israel, o Egito de Anwar Saadat(1979) e ao Itzhak Rabin que assinou tratado de paz com o país árabe de maior fronteira com o Estado Judeu, a Jordânia, do rei Hussein,(1994), dizendo ser o terceiro líder a fazer acordo de paz com país árabe.

Já pode ter caído no esquecimento, mas Israel já teve relações diplomáticas com outros países árabes e muçulmanos, em consequência dos Acordos de Oslo. Em 1996, Israel teve relações com Marrocos, Tunísia, Omã e Niger. Em 1999 trocou embaixadas com a Mauritânia e relações comerciais abertas com Qatar, desde 1986, sem mencionar as relações que Israel tem com outros países árabes e muçulmanos, fora dos holofotes. Em 2011, o recém criado país, Sudão do Sul, cristão, que se separou do Sudão, muçulmano, reconheceu o Estado de Israel.

A grandeza da revelação da semana passada é trazer ao público e ao mundo, abertamente, que os EUA estão dispostos a ter relações com o Estado de Israel. Relações que os dois países têm às escondidas, há cerca de 20 anos.

Aliás, quando eclodiu a 2ª intifada, em 2000, Marrocos, Tunísia e Omã cortaram as relações com Israel; em 2002 foi a vez do Níger e em 2009, em consequência das lutas com Gaza, a Mauritânia e Qatar fecharam suas representações.

Acordo de paz. Netanyahu chamou o tríplice anúncio de Trump, Emir Mohammad Bin Zayed (conhecido por EMZ) e Netanyahu, de acordo de paz. Melhor seria ter dito, acordo de normalização das relações. Os EUA não têm fronteiras, nunca lutaram com Israel e estão a 2.400km de distância. Quem assinam acordo de paz são países em litígio, que não é o caso aqui.

Há contradições do que Israel deu em troca a este anúncio. Tanto o presidente Trump, como seu conselheiro, genro e principal articulador nas negociações, Jared Kushner disseram que Israel não fará a anexação que Netanyahu queria fazer e pela qual muito lutou que entrasse no Plano do Século.

Os próximos do Netanyahu dizem que é apenas adiamento da anexação, mas fala-se agora mais em “ribonut”, que em hebraico significa soberania. De qualquer modo, os EUA terão que consentir qualquer ação neste sentido e os mais ideológicos da direita alegam que Netanyahu deixou escapar esta ação histórica.

O que incomoda os que tratam da defesa e segurança de Israel são as notícias de que Netanyahu teria permitido vender os caças super-modernos e sofisticados F35 (foto) aos EUA. Netanyahu nega que tenha consentido, mas até mesmo o Ministro das Relações Exteriores dos EUA, Anwar Gergash, disse ontem (20): “a normalização deverá tirar qualquer obstáculo para a venda de F35 ao meu país”. O presidente Trump já confirmou: “os EUA têm dinheiro e nós temos caças”.

Israel talvez não deve se preocupar com a venda direta dos F35 aos EUA, mas isto pode ser precedente para que outros países árabes peçam o super-caça. E como sabemos, este mundo é imprevisível; hoje amigo, amanhã quem sabe. O Irã e a Turquia tiveram ótimas relações com Israel, mudou o regime e hoje um quer “varrer o Estado Sionista do mapa mundial” e o outro é hostil e ainda não declarou guerra contra Israel. Sem mencionar a paz “gelada” entre Israel com a Jordânia e o Egito.

Um ponto que também foi aberto, é a tomada de decisões do Netanyahu, sem se consultar com os diretamente envolvidos nos assuntos de segurança. Parece até a repetição da tomada de decisão da venda de submarinos modernos, iguais a de Israel, que são estratégicos, ao Egito e que Netanyahu teria autorizado, quando perguntado pela chanceler Angela Merkel. Este caso, que pode envolver grave acusação de corrupção, está sendo varrida para debaixo do tapete, apesar de que o Ministro da Defesa na época da venda, General (Res). Moshe (Bugui) Yaalon, considera ser o maior escândalo da história do país.

Jamais, um dirigente de Israel tomou decisões nas áreas da segurança nacional sem se consultar e informar as partes diretamente envolvidas. Quando perguntado, porque não informou ao seu Primeiro Ministro Substituto e Ministro da Defesa atual e ao seu Ministro do Exterior, Gantz e Ashkenazi (respectivamente), Netanyahu disse que não queria que as informações do acordo com os EUA vazassem. Se o premier não confia em 2 ex-chefes do Estado Maior das Forças Armadas de Israel, que tiveram em suas mãos os maiores segredos do país e atualmente servem no seu governo, em quem pode confiar? Numa democracia não pode haver padrão de ação em que líder do país toma decisões sozinho sem consultar as partes relevantes. Pelo visto Netanyahu está disposto a ir a mais uma rodada de eleições, em novembro querendo mostrar sua habilidade diplomática e ao mesmo tempo humilhar seus possíveis rivais numa nova eleição, Gatz e Ashkenazi.

Em Israel, todos se empolgaram com a notícia da normalização de relações com os EUA. Todos os canais de TV israelenses enviaram correspondentes para transmitir desta região desértica, com riqueza arquitetônica adquirida pelo ouro negro do fundo das areias. O israelense já fantasia as viagens que fará ao novo país, recém descoberto, como foi na época o caso do Egito e da Jordânia.

A esperança é que agora venham outros países árabes para declarar abertamente que reconhecem o Estado Judeu e como disse o Anwar Gergash na quinta(20): “não podemos ser prisioneiros dos palestinos eternamente”. Os que parece que seguirão os EUA são Sudão – apesar de que o porta voz do Ministério das Relações Exteriores do país foi logo destituído do cargo, depois de declarar que os dois países têm contatos. Cogita-se que Baharein, Omã, Quweit e até mesmo Arábia Saudita estariam também dispostos. Os interesses comuns superam muitos obstáculos, apesar de que psicologia embutida durante décadas entre os mais idosos os detém.

Os palestinos. Sua liderança ficou furiosa. Abbas mandou seu embaixador no Emirados retornar e ameaça fazer o mesmo com outros países árabes se reconhecerem Israel. Ele é um dos que vivem no passado. O problema palestino só interessou aos árabes para mostrar frente unida perante os outros, o Ocidente. Nos EUA vivem cerca de 100.000 palestinos que são a favor da normalização. Um líder palestino, Sofian Abu Zaidan, ousou criticar Mahmoud Abbas dizendo: “você nos levou até o canto. Se olha no espelho”.

Em Jerusalém, o Mufti – líder religioso muçulmano- disse que não permitirá a entrada dos turistas dos EUA que vierem rezar nas mesquitas do Monte do Templo (uma das cláusulas do acordo). Palestinos atearam fogo na bandeira dos EUA.

O Irã. Khamenai chamou o país vizinho do Emirados de “inimigo do mundo islâmico e traidor do povo palestino… se os EUA pensam que aproximação aos EUA e Israel vão lhe trazer segurança, eles estão enganados”. Na quinta (20) já houveram provocações. Navio pesqueiro iraniano entrou nas águas territoriais dos Emirados – provavelmente para fazer provocação – e a Guarda Costeira abriu fogo, matando 2 pescadores. Horas depois a marinha iraniana apreendeu um navio dos Emirados e com sua tripulação levou ao seu território.

É o padrão de sempre, provocar e mostrar quem tem honra maior. Apesar desta provocação iraniana, espera-se que com a normalização de relações com os Emirados Árabes Unidos, os dois lados ganhem. Como disse homem de negócios dos EUA: “Israel tem a melhor tecnologia do mundo. Queremos que a tecnologia avançada israelense venha para cá e formaremos o Silicon Valley da região”.


DAVID S. MORAN – Mora em Israel, é formado em Relações Internacionais pela Universidade Hebraica de Jerusalém e Major da reserva do exército israelense.

vavamoran@hotmail.com

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