Viva o Gordo – por Arnaldo Niskier
Jô se insere na galeria brasileira de grandes humoristas, ao lado de Chico Anísio, Haroldo Barbosa, Max Nunes e uns poucos mais. Valorizou a figura do Gordo e ironizou os déspotas com o famoso Reizinho (“Sois rei?”), que interpretava às mil maravilhas.
Ficamos tristes com o falecimento, aos 84 anos de idade, do genial Jô Soares. Criador de cerca de 300 tipos que brilharam no teatro, no cinema e na televisão, Jô vivia em São Paulo, mas era carioca da gema, o que talvez explique o seu extraordinário humor, desde os tempos de Colégio Franco Brasileiro. Já trabalhando na televisão, gostava de frequentar a sede da Rede Manchete, no Russell, onde confraternizava com o diretor Adolpho Bloch. Seguidas vezes eu o vi dançar como velho Bloch, em cenas verdadeiramente hilárias.
Nos meus registros, constam participações no famoso “Viva o Gordo”, em que ele entrevistava as chamadas personalidades. A primeira vez que nos defrontamos foi em 2010, no meu programa “Educação em Debate”, na TV Universitária. Depois foi em 2003 e, por último, em 2012, quando fui à Rede Globo para falar do livro “Memórias de um sobrevivente”, que lancei em plena pandemia. Tive que responder a uma série de perguntas provocativas, como era natural no estilo do humorista. Lembro bem de uma delas: “Sei que os seus pais eram poloneses. Você fala polonês?” E aí ele improvisou um texto aparentemente nessa língua eslava, em que encaixou a palavra “prostitute”. Senti logo que havia molecagem no ar e respondi com o meu jeito carioca de ser: “Eu não falo polonês, mas se você está me elogiando, desejo o dobro a você…” Ele sentiu o golpe e ficou sem jeito. Nunca mais me esqueceu.
Jô se insere na galeria brasileira de grandes humoristas, ao lado de Chico Anísio, Haroldo Barbosa, Max Nunes e uns poucos mais. Valorizou a figura do Gordo e ironizou os déspotas com o famoso Reizinho (“Sois rei?”), que interpretava às mil maravilhas. Esse personagem cresceu após uma saída de táxi do acadêmico Aurélio Buarque de Holanda da sede da Academia Brasileira de Letras, no centro da cidade, quando um motorista estranhou o dourado do fardão vestido pelo imortal e repetiu a frase que se tornou um bordão dos mais preciosos, dos muitos criados por Jô.
Apaixonado por futebol, Jô não escondia a sua preferência pelo Fluminense: “Sou tricolor de corpo e alma.” Foi casado com várias atrizes importantes, como Teresa Austregésilo, Cláudia Raia e Sílvia Bandeira. Era um homem verdadeiramente feliz.
ARNALDO NISKIER
ARNALDO NISKIER – Membro da Academia Brasileira de Letras, presidente do CIEE/RJ e formado em Matemática e Pedagogia. Saiba mais.